Quanta falta nos faz, Ulysses!, por Marcus Pestana


No último dia 12 de outubro, completamos 25 anos sem Ulysses Guimarães, o grande timoneiro da redemocratização. Ele, que em plena ditadura, nos tempos mais sombrios, com a mão no leme das oposições, ditava o rumo: “navegar é preciso!”. Sonhou outro Brasil e lutou por ele. Um país onde a base de tudo seria a liberdade. Escoltada de perto pela ética, pela fome de justiça e pelo espírito público.

Da anticandidatura presidencial até a conquista da agenda democrática, a mesma coragem, o mesmo patriotismo. A memória e a história de Ulysses bem poderiam iluminar um pouco os nebulosos tempos presentes. Ali, o rumo era claro: anistia, Constituinte e eleições diretas. E daí resgatar a cidadania e os direitos sociais.

Era doce e poético quando queria, era duro e cortante quando precisava: “Eu tenho ódio e nojo à ditadura”. Sabia ser generoso com os adversários, não os fazia inimigos. Sabia que “não se pode fazer política com o fígado, conservar o rancor e ressentimentos na geladeira. A pátria não é capanga de idiossincrasias pessoais”.

Sua paixão, sua quase religião, sua razão de viver era a política. Tinha orgulho e enchia o peito para se dizer político. “Os partidos políticos existem para alcançar o poder”, e “Sou louco pelo poder e para isso eu vivo”. Poder aqui não era tradução de vaidade, ambição pessoal ou fome de poder pelo poder. Não sei como ele se comportaria hoje diante do triste espetáculo dos últimos anos. Lá do fundo do oceano em Angra dos Reis ou da mais alta nuvem, deve estar nos recriminando: “Meninos, não era nada disso, vocês avançaram em muitos pontos, mas a utopia da Nova República não era essa”. Certamente, estaria enojado com a corrupção generalizada, o clientelismo desenfreado e o nepotismo disseminado.

Poderia nos ensinar novamente: “O poder não corrompe o homem; é o homem que corrompe o poder. O homem é o grande poluidor, da natureza, do próprio homem, do poder. Se o poder fosse corruptor, seria maldito e proscrito, o que acarretaria a anarquia”. E daria o norte: “Não roubar, não deixar roubar, pôr na cadeia quem roube, eis o primeiro mandamento da República”.

Como otimista inveterado e lutador incansável, estaria dizendo à nação, novamente, como na instalação da Constituinte: “A nação quer mudar, a nação deve mudar, a nação vai mudar”; e “A sociedade sempre acaba vencendo, mesmo ante a inércia ou o antagonismo do Estado”.

Mirando a tamanha crise que enfrentamos 25 anos após sua morte, poderia até se abater e sentir angústia por alguns minutos. Esmorecer, nunca. E estimularia os descrentes, recomendando a luta como caminho, repetindo suas últimas palavras ao PMDB: “Vou livre como o vento, transparente e cantando como a fonte. Mas não vou para casa. Vou morrer fardado, não de pijama”.

Ulysses, não iremos para casa, o Brasil é maior que a crise, morreremos fardados. De certa forma, Ulysses, desculpe-nos por nossos erros e nos ilumine com sua história e seu exemplo.

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16 outubro, 2017 Artigosblog Sem commentários »

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