Chegou a hora: EC 29, mitos, riscos e realidade, por Marcus Pestana


A semana será decisiva para a aprovação da regulamentação da Emenda Constitucional (EC) 29, que vincula recursos orçamentários ao SUS. Na terça-feira, teremos a reunião geral com a presença de quatro ministros e diversas lideranças da saúde. E, na quarta, o PLP 306/2008 será votado pela Câmara dos Deputados.

A EC 29 foi aprovada em 13 de setembro de 2000. Vários dispositivos precisavam ser regulamentados. Há 11 anos, a sociedade brasileira aguarda o posicionamento do Congresso Nacional. É a hora.

Uma tarefa essencial de partidos e líderes políticos é a ação pedagógica: informar, esclarecer, dar transparência aos assuntos de interesse da população. Mas corre-se sempre o risco do discurso político, às vezes inflamado e demagógico, obscurecer a realidade.

O financiamento da saúde é complexo e difícil. O SUS se defronta com uma equação explosiva: direitos amplos e generosos de cidadania, recursos escassos e custos crescentes, graças à inovação tecnológica permanente e às mudanças demográficas.

O primeiro mito que se cultiva permanentemente é de que o problema do SUS não é dinheiro e sim gestão. Desvios e desperdícios são sempre denunciados. Precisamos aprimorar a gestão, sempre. Mas mesmo as soluções de gestão custam dinheiro. Há evidências claras de que o SUS é subfinanciado. Um plano privado de alta cobertura custa, em média, R$ 5 mil por ano. O SUS trabalha com um investimento per capita de R$ 770. O Brasil investe no sistema público de saúde US$ 431 por habitante/ano (BIRD, 2009), o Chile US$ 548, a Argentina US$ 820, Portugal US$ 1.890 e Estados Unidos US$ 3.601. Portanto, vamos acabar de vez com essa cantilena de que sobra dinheiro no SUS. A solução do financiamento da saúde no Brasil é maratona de 42 quilômetros e não corrida de cem metros.

Outro mito: só é possível avançar com a criação de novo tributo. E os R$ 370 bilhões injetados no BNDES, para empréstimos subsidiados às grandes empresas? E os quase R$ 200 bilhões pagos de juros ao ano? E a máquina inchada com inéditos e inacreditáveis 39 ministérios? E a gastança com o aumento dos gastos correntes? E os sucessivos recordes na arrecadação federal, na última década, sem que os investimentos em saúde acompanhassem proporcionalmente?

Na quarta-feira, produziremos um fato de repercussão nacional que poderá passar a imagem de que um avanço substancial está sendo alcançado no enfrentamento do baixo nível de investimento no SUS. No entanto, corremos o risco de produzir retrocesso. O parágrafo 2º, do artigo 6º, retirou da base de cálculo sobre a qual recaem os 12% de Estados e DF o Fundeb. Menos R$ 7 bilhões para a saúde. O impacto financeiro será zero no governo federal (já que a CSS não será aprovada) e municípios e negativo nos Estados e DF. O Senado Federal precisa corrigir essa distorção.

A aprovação da regulamentação da EC 29 será importante, ao normatizar os gastos na saúde. Pacificará a relação dos gestores do SUS com tribunais de contas, ministério público, conselhos de saúde, legislativos, imprensa. Mas o financiamento adequado continuará uma questão em aberto.

Quarta-feira, não estaremos concluindo uma caminhada, mas iniciando uma longa travessia.

(*) Marcus Pestana é deputado federal pelo PSDB-MG. Artigo publicado no jornal “O Tempo” em 19 de setembro de 2011. (Foto: Ag. Câmara)

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19 setembro, 2011 Artigosblog Sem commentários »

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