Questão de fé


Totalmente parado e sem projeto, Planalto tenta “recomeço” sob desconfiança

Com a troca de Antonio Palocci por Gleisi Hoffmann, passou-se a falar em recomeço do governo Dilma Rousseff, em tomada das rédeas por parte da presidente da República e em redução da tutela de Lula sobre a atual gestão. “São, ainda, meras conjecturas que dependerão de muita atitude antes de se verem comprovadas. Considerar que aquilo que começou mal passará a ir bem de uma hora para outra não passa de mera questão de fé”, diz a Carta de Formulação e Mobilização Política divulgada pelo Instituto Teotônio Vilela nesta quinta-feira (9). Até agora, segundo o ITV, o que se vê é a total paralisia da máquina e a falta de projeto para o país. Leia abaixo a íntegra.

A troca de Antonio Palocci por Gleisi Hoffmann foi recebida com evidente boa vontade pela opinião pública, a julgar pelo que os jornais publicam hoje. Fala-se em “recomeço” do governo Dilma Rousseff, em tomada das rédeas por parte da presidente da República e em redução da tutela de Lula sobre a atual gestão. São, ainda, meras conjecturas que dependerão de muita atitude antes de se verem comprovadas.

Mesmo em meio a este oba-oba, persistem as críticas à dificuldade de articulação política do governo. Se fosse só este o problema, ainda estaria bom. O que temos hoje é uma paralisia quase completa da máquina sob o comando de Dilma. Alguém é capaz de citar uma única iniciativa de vulto tomada até agora pela presidente?

Dilma Rousseff teria muito menos dores de cabeça, e poderia até mesmo manter-se distante dos meandros políticos que tanto a desgostam, se tivesse uma proposta clara para o país. Em torno de projetos, seria muito mais fácil aglutinar apoios, inclusive, e principalmente, da sociedade. Mas é evidente que este projeto não existe – pelo menos a olho nu.

O Congresso não recebeu da gestão Dilma uma única proposta com poder de mobilizar corações e mentes em torno dela. Mas continuou a ser alvo de avalanches de proposições tratadas de maneira desconexa e em forma de contrabandos inseridas em medidas provisórias. Como se muda um país desta maneira?

“O governo desperdiçou sua lua de mel sem ter tocado um único projeto de reforma ou de superação dos obstáculos ao crescimento sustentado. Em 2010, quando o Brasil estava crescendo a 7,5%, era mais fácil superar esses obstáculos; com a queda do nível de atividade, a lentidão do governo está provocando mais estragos”, avalia Merval Pereira n’O Globo.

No discurso de ontem, a presidente parece ter se dado conta do pouco que realizou nestes cinco primeiros meses. Parecia até a fala de quem estava assumindo ontem o governo. “Temos promessas a cumprir e vamos cumpri-las. Temos programas a executar e vamos executá-los”, disse ela, ao empossar Gleisi Hoffmann. OK, estamos todos de acordo. Mas já não passou da hora de ir de palavras a atos?

Na solenidade, Dilma também criticou o comportamento “quase sempre ruidoso” da oposição. Quis, assim, imputar à ação da minoria no Congresso a responsabilidade pela queda de seu principal ministro, sem querer se dar conta de que Palocci caiu por suas próprias escolhas e pela dificuldade de comprovar que agira eticamente enquanto enriquecia e chefiava a campanha da presidente– não se sabe em qual ordem…

De mais a mais, jogar sobre os ombros das bancadas reduzidas da oposição no Parlamento o peso da crise é desdenhar solenemente da lógica. Quem, como Dilma, tem 77% da bancada do Senado e 75% da da Câmara não deveria se preocupar tanto com a oposição. Ou será que o incômodo está no que a oposição revela?

É também desdenhar da inteligência alheia ignorar a guerra fratricida que os petistas travaram entre si pela queda de Palocci e travam agora para promover a próxima baixa do governo, a do ministro de Relações Institucionais. Assim como não enxergar a insatisfação convenientemente contida e prestes a explodir do PMDB.

“A cúpula do PMDB ameaça se rebelar, caso não tenha peso na escolha do novo articulador político, e alertou a presidente que a crise política não se encerra com a saída de Palocci, pois a articulação política do governo motiva muitas insatisfações”, informa O Globo.

Se os parceiros são os mesmos do governo passado, se o projeto político não mudou, por que Dilma tem tanta dificuldade em agregar seus aliados e em apresentar à sociedade brasileira uma agenda clara de desenvolvimento do país? Não parece sensato imaginar que, sem um cardeal experiente como Antonio Palocci do lado, a vida da presidente vá melhorar.

Mesmo com o respiro que os formadores de opinião parecem dispostos a lhe dar, o idílio de Dilma com o público estilhaçou-se. A presidente não dispõe mais do conveniente pedestal que a apartou da necessidade de ter de responder assertivamente às demandas de um país que precisa fazer muito mais para crescer com equilíbrio.

Pode até ser que, finalmente, a atitude do governo melhore, que titubeios e balbucios desapareçam. Mas considerar que aquilo que começou mal passará a ir bem de uma hora para outra não passa de crença ou torcida.

Por tudo o que se viu nestes cinco meses, apostar no sucesso do governo Dilma Rousseff ainda é mera questão de fé. Mas, para o bem do país, seria bom que as montanhas começassem a ser removidas.

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9 junho, 2011 Últimas notícias Sem commentários »

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