Os cinco desafios do SUS, por Marcus Pestana


A consolidação nos últimos 22 anos do Sistema Único de Saúde, com sua generosa proposta de acesso universal e integral de qualidade, é das mais importantes heranças da Constituição de 88. Avançamos, mas estamos a léguas de distância do sistema público de saúde dos sonhos. A saúde no Brasil é melhor que há 20 anos, mas são inúmeros os pontos de estrangulamento.

Nesse ciclo que se abre com a posse da nova presidente da República, do Congresso, de governadores e assembleias legislativas, é preciso colocar como tarefa central o ataque aos obstáculos que inviabilizam avanços nas políticas públicas de saúde. Cinco são os desafios, adiante indentificados.

Mudança do modelo de atenção: somos presididos pela lógica hospitalocêntrica. A oferta dos serviços se apresenta à população de forma desarticulada. O objetivo deve ser a construção de redes de assistência integral coordenadas por uma atenção primária à saúde extremamente qualificada. É fundamental que hospitais, UPAs, centros de especialidades, centros de diagnóstico, formem um todo articulado, orquestrado pela estratégia de saúde da família cada vez mais fortalecida. Experiências implementadas em Minas Gerais, como o Canal Minas Saúde, o Programa de Educação Permanente, o Plano Diretor da Atenção Primária e a Rede de Urgência e Emergência oferecem boa pista sobre os caminhos a serem percorridos. Sem investirmos na prevenção, promoção da saúde e atenção primária de qualidade para enfrentar o predomínio das doenças crônicas, ficaremos enxugando gelo na porta de hospitais e UPAs.

Mudança do modelo de financiamento. Impossível garantir o direito constitucional de acesso integral e universal ao sistema de saúde com pouco mais de R$ 700 para habitantes/ano de investimento. A comparação a outros países com sistemas semelhantes e com saúde complementar (um plano com cobertura próxima ao que propõe o SUS custaria em média R$5 mil/ano) evidencia forte subfinanciamento. Não há mágica. O SUS precisa de muito mais dinheiro. O gargalo é financeiro. Há resistência à criação de impostos. A carga tributária é pesada. Cabe ao governo federal e ao Congresso descobrirem alternativas de rearranjo orçamentário para viabilizar o aumento de investimentos na saúde.

3) Mudança no modelo de gestão. O dinheiro é curto, mas é possível fazer mais e melhor no uso de cada real. Profissionalizar a gestão, incorporar modernas ferramentas de gerenciamento, evitar duplicação de meios, clarear o pacto federativo setorial, inovar nas estruturas, introduzir ganhos de escala, permitirá avanços a partir do aumento da produtividade dos recursos. Construção de modernos sistemas de regulação, introdução do cartão SUS e do prontuário eletrônico, racionalização da estrutura de serviços hospitalares fragmentada em uma rede pulverizada e com ineficiências podem produzir resultados. Também a quebra de preconceitos e a adoção de estruturas gerenciais flexíveis (OSs, OSCIPs, fundações públicas de direito privado) contribuirão para melhorar o desempenho do sistema.

Mudança do modelo de incorporação tecnológica. Diariamente são descobertos medicamentos, novas linhas terapêuticas e sofisticados equipamentos hospitalares. São avanços importantes, mas caros. Sem a preocupação de restringir o acesso, mas conscientes de que não podemos ter postura passiva e ingênua diante de tão poderoso mercado, o SUS precisa solidificar forte regulação sobre a introdução de novas tecnologias. O caminho poderia ser a criação de agência específica para tratar do assunto. Teríamos impacto positivo, atenuando a judicialização da saúde.

5) Mudança do modelo de organização do mercado de trabalho. Aspecto complexo, em que a capacidade de indução dos gestores tem limites claros, mas precisa avançar. Como estimular jovens médicos a se especializarem em saúde da família, pediatria, clínica geral e geriatria? Como fixar profissionais na Amazônia, no Nordeste, no Jequitinhonha? Como lidar com a realidade das cidades que, pobres e distantes, pagam altos salários e ainda assim não conseguem atrair médicos? Essa discussão precisa ser aprofundada.

Todas as pesquisas apontam a saúde como prioridade um da população. “O SUS não é um problema sem solução, é uma solução com problemas”. Cabe a todos que têm responsabilidade com a construção da cidadania se debruçar sobre essa agenda de desafios e garantir avanços para que a chama da reforma sanitária de 88 não se apague.

(*) Marcus Pestana é deputado Federal (PSDB-MG) e ex-secretário de Saúde de Minas Gerais. Artigo publicado no jornal Correio Braziliense em 18 de fevereiro de 2011.

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19 fevereiro, 2011 Artigosblog 8 Commentários »

8 respostas para “Os cinco desafios do SUS, por Marcus Pestana”

  1. Gisele disse:

    Artigo lúcido.

  2. Concordo com os grandes desafios do SUS, com exceção do primeiro. Não acredito que a inversãod e modelo seja nosso desafio. Já houve a proposta, implementações importantes. É a tend~encia mundial e não há como fugir disto. O que precisa é a inversão de concepção de gestores e profissionais, assim como da população. Temos hoje em MG, cidades com menos de 5 mil habitantes com hospital, quando uma UPA seria o suficiente junto com PSF. Temos cidades com mais de 500 mil habitantes sem CAPS 24 horas, ou sem PSF em todas as unidades básicas e achando que é preciso construir hospital. então não é o modelo que tem de inverter e sim os profisisonais, ai esbarra no último desafio. Não basta forma, tem que investir nos já formados e atuantes, senão não adiantará.

    Um ponto que senti falta foi quanto a gestão de qualidade da assist~encia e sistema de informação é falho. Dois itens primordiais para sustentação do sistema, o que impede muitas vezes gastos desnecessários. O SUS precisa sim de financiamento, mas não antes de saber onde escoa o dinheiro investido, onde está se gastando desnecessariamente.

    Infelizmente pensasse em mais e mais verbas, e não em qualidades, auditorias, etc. talvez seja um pensamento mecanicista, ultrapassado, ams ainda válido para ser usado como discurso inovador.

  3. Helidea Lima disse:

    Parabens pelo artigo. Com certeza grandes desafios que ficam mais faceis de serem superados quando se tem uma Liderança com constancia de propósito! Falta melhoria da qualidade da gestão!

  4. Fabio Pinheiro disse:

    O Estado de Minas Gerais é um grande desafio para qualquer político, principalmente para o Deputado Federal Marcus Pestana, pois existem muitas cidades pequenas, com pouca arrecadação, o povo do interior sofre com falta de recursos e acesso aos serviços de saúde de uma cidade grande. Por isso o grande desafio é levar esses serviços ao interior do Estado, desafogando os hospitais da capital, melhorando o atendimento e capacitação dos profissionais do interior. O povo do interior é o coração do Estado de Minas Gerais. Com relação aos desafios do SUS concordo plenamente com a colocação “O SUS não é um problema sem solução, é uma solução com problemas”.

  5. ana goulart disse:

    Parabéns pelo artigo!

  6. ana goulart disse:

    parabéns pelo artigo!

  7. Carla dos Santos disse:

    Exmo. Sr. Deputado Marcus Pestana, o Estado de Minas Gerais está muito atrasado quando se diz respeito a TERAPIA NUTRICIONAL, as nutricionistas que trabalham para o Estado, especificamente na Fhemig estão esquecidas e desatualizadas, tendo em vista que nos ultimos congressos a representatividade foi zero, quando comparamos o Estado de Minas com RJ e SP ficamos atrás. Nos ajude com políticas públicas que vão valorizar a nossa classe e com isso investir na TERAPIA NUTRICIONAL reduzindo o tempo de internação dos pocientes, gerando economia aos cofres públicos e mais leitos disponíveis, pois a Terapia Nutricional é uma grande aliada para recuperação dos pacientes. O Estado de Minas Gerais precisa se destacar e acompanhar os demais estados da região sudeste, para isso precisamos de vontade política e por isso contamos com o DEPUTADO FEDERAL MARCUS PESTANA. Um grande abraço de todas as nutricionistas do Estado de Minas Gerais.

  8. MÁRCIA MARTINS disse:

    Em primeiro lugar acho q deveria eleger diretores mais competentes e menos corruptos, pq aqui em goiânia por exemplo, entrei em um laboratório q foi criado em 2009 e parecia q já tinha uns 10 anos, ou seja, usam materiais de 3ª categoria, mas devem faturar como se fosse de primeiro, pq o custo da obra é altissimo. Deve haver mais fiscalização c o dinheiro público, agora mesmo mais de 10 milhões em vacina da gripe foi jogados fora, um total descaso, e isso pq eu tentei vacinar 2 vezes esse ano contra a H1N1 e não consegui. Segundo, se vcs vão a um hospital na Itália, onde todos e não somente alguns têm direito a saúde gratuita, as coisas lá funcionam com tamanha eficiência q quase não acreditei. Mas Bellusconi privatizou a saúde no norte da itália, no sul já é u pouco pior. Não sou a favor de privatizar 100%, mas 50% sim, ou seja, uma parceria pública/privada. Então pergunto: Pq não privatizar 50% de todos sos hospitais publicos? DEVEMOS PARAR COM ESSE FISIOLOGISMO, E ENTREGAR CARGOS TÃO IMPORTANTES NAS MÃOS DE POLÍTICOS INCOMPETENTES.

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