Prioridade fora da pauta, por Ricardo Tripoli


Não bastasse o caso de Barcarena (PA), onde nascentes amazônicas foram infectadas por rejeito de bauxita, dias depois 300 toneladas de minério atingiram rios em Santo Antônio do Grama (MG), trazendo de volta o fantasma de Mariana.

 A recorrência desses desastres ambientais de grande monta, e sua repercussão modesta, revelam como o meio ambiente perdeu relevância no debate público. Mais que falta de apelo, o tema perdeu influência e sustentação política no Brasil.

É tanta urgência no país, recessão, violência e corrupção, que o meio ambiente tem sido tratado como perfumaria. O curioso é que há pouco o tema era central no soft power brasileiro, núcleo de nossa influência e prestígio internacionais.

Quando foi que o Estado brasileiro virou as costas ao tema? Teria a sociedade perdido o interesse por ele? Neste 2018 de tantas expectativas, para onde vai a agenda ambiental?

A deriva do tema não deixa de ser uma contradição na era dos carros elétricos, das energias renováveis e das éticas de consumo consciente e proteção animal. Quanto mais arraigada a conscientização, menos apelo a causa parece despertar.

O fato é que o projeto nacional de desenvolvimento sustentável, se é que havia um, fracassou. Restou um compêndio de boas intenções irrealizadas, revelando a incapacidade do país em administrar o próprio patrimônio natural.

Embora a proteção ambiental seja cláusula pétrea, entra ano e sai ano, eleição após eleição, e nenhum partido foi capaz de oferecer à sociedade um programa à altura. Ao contrário, na eleição abundam as platitudes e a retórica infantilizada.

Enquanto isso, no Brasil real, a combinação de uso predatório dos recursos, abrandamento normativo e sucateamento do aparato fiscalizatório vai tecendo em silêncio novos retrocessos.

A colonização degradante dos remanescentes naturais institucionalizou-se. O vazio Estatal gera a ilegalidade, que leva ao crime, e este à violência, criando o ambiente ideal para a pilhagem de riquezas naturais e para a degradação.

O fato é que todos temos responsabilidade. Nem só com vitimização se explica a fragilidade da ação ambiental. As pessoas devem se reorganizar, pois a relevância do tema para os governos depende do poder de persuasão e de pressão do cidadão.

O caso da Renca, quando tentou-se liberar a exploração mineral na Amazônia, mostrou que o eclipse da mobilização ambiental pode sim ser revertido. Se a sociedade diz ‘basta!’, governo algum vai adiante.     

A turma do consumo consciente, da economia solidária, da proteção animal, os que trocaram o carro pela bicicleta e os que separam o lixo voluntariamente, entre tantos na multidão anônima de indivíduos conscientes e responsáveis, formam o coração do ativismo ambiental no século 21. O tema jamais terá prioridade sem a ação ecumênica e pluripartidária de todos.

Faço essas considerações pois dias atrás um candidato à presidência defendeu que o Ministério do Meio Ambiente seja anexado ao Ministério da Agricultura e Pecuária. Para meu espanto, foram tímidos os protestos contrários.

Mais uma década assim, no ritmo dos últimos 15 anos, e faremos um mal irreversível ao país. Estaremos mais pobres, mais desiguais, mais conflagrados, com recursos e possibilidades menores.

Ou a sociedade encara 2018 como um ponto de virada na agenda ambiental, ou sabe-se lá que futuro nos espera. 

(*) Ricardo Tripoli é ambientalista e deputado federal (PSDB-SP). Artigo publicado no jornal “O Globo” em 13/4. (foto: Alexssandro Loyola)

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13 abril, 2018 Artigosblog Sem commentários »

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