Carta de Formulação e Mobilização Política


O morro não tem vez – Análise do Instituto Teotonio Vilela

logo-itvConfrontos violentíssimos em comunidades do Rio estão se tornando de novo recorrentes. Após breve suspiro, pelo menos para quem assiste de fora dos morros, após a disseminação das experiências das UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora), a guerra entre facções criminosas voltou a dominar o cenário.

Os embates nos morros cariocas, como o que conflagra a favela da Rocinha há uma semana, não são problema do Rio de Janeiro. São desafio para todo o país, pois expressam deficiências insuperadas, dilemas mal resolvidos e uma lista de políticas públicas fracassadas com as quais se perdeu, e ainda se perde, muito tempo ao longo das últimas décadas.

Em primeiro lugar, ilustram a falência do sistema de segurança pública no país. A criminalidade age com unidade nacional de comando; a lei não. Para ilustrar: o líder do tráfico na Rocinha está preso a 3,5 mil quilômetros ou 5 horas de voo de distância, mas a um toque de celular mantém controle absoluto de seu negócio auxiliado por nada menos que 27 advogados e assessorado por um bando de comandados que o visita dia sim dia não na prisão em Rondônia.

A esta estrutura hierarquizada, o Estado brasileiro contrapõe polícias compartimentadas em instituições de atuação estadual e fragmentadas entre corporações civis e militares. Hoje, na maioria das vezes, a bandidagem só é incomodada quando alguma facção rival resolve quebrar algum acordo tácito e investir na conquista de novos territórios.

O crime nutre-se do que permeia os quase 16 mil quilômetros de fronteiras do país sem nenhuma dificuldade de ingresso. Drogas, armas, contrabando continuam sendo matéria-prima e produto disponível corrente na contravenção e, ano após ano, não se vê esforço decididamente sério a partir de Brasília para fechar esta porta escancarada.

Há, também, a prevalência de mazelas seculares do país, como a vergonhosa desigualdade social. Estudos recentes estão deitando ao chão a falácia de que nos anos recentes o Brasil havia avançado léguas no combate a esta chaga. Sabe-se agora que ricos continuam tão ricos quanto antes e que a melhora no rendimento dos pobres foi insuficiente para de fato fazer o Brasil reduzir as diferenças entre a base e o topo da pirâmide social.

No caso específico do Rio de Janeiro, a guerra de facções expõe como a bandidagem que estava nos palácios expropriou a Cidade Maravilhosa e fez seus cidadãos de reféns. As UPPs eram, de fato, boas políticas, mas ficaram incompletas. Houve o avanço do policiamento, mas a fábrica de gerar oportunidades para o crime – ou seja, a falta de oferta de melhorias sociais, bens culturais e, sobretudo, educação – continuou operando a pleno vapor.

Não são só os cariocas que sentem na pele o recrudescimento da violência. Bandos que não encontram espaço na guerra de alto calibre fluminense atacam no interior de Minas Gerais, detonando agências bancárias onde há décadas não se ouvia nem tiro de espingarda de chumbo. Desde a década passada, o Nordeste já fora ocupado pelas mesmas facções que dominam o Rio.

Segurança pública está entre as principais preocupações dos brasileiros, disputando o topo com o desemprego, a saúde e a corrupção. Mas o enfrentamento do problema é sempre adiado. Espera-se que, na campanha eleitoral que se avizinha no próximo ano, não seja. A guerra na Rocinha vai sempre nos lembrar de que a bomba pode estourar a qualquer momento, e bem no colo de qualquer um de nós.

(FONTE: ITV)

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25 setembro, 2017 Últimas notícias Sem commentários »

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