A democracia sitiada, por Yeda Crusius
Tomo de empréstimo este título do artigo de Sérgio Abranches na FSP de ontem. De modo lúcido, e com extremada cultura pela qual é reconhecido, Abranches toca num ponto fundamental do momento atual não apenas brasileiro, mas também brasileiro. A democracia representativa está em crise. Emerge uma espécie de alienação com a noção de democracia destituída de política, e até mesmo antipolítica.
A desconfiança da população na política e nos partidos, que são cada vez mais oligarquizados “dominados por grupos que se perpetuam no poder e usam a estrutura da sigla não para canalizar demandas e valores das pessoas que pretendem representar, mas como trampolim para outros cargos e funções”. Aparelham. “O caso da Lava Jato mostra que, no Brasil, esse controle de cargos também teve por objetivo negociar transações milionárias e ilegais”. Digo mais: bilionárias.
Creio que ninguém exceto os arquitetos da organização criminosa, no caso da Lava Jato composta dos donos da Odebrecht e empregados contratados para isso tanto pela empresa quanto pelos partidos políticos comandados pelos governos do PT. Mas, como diz em suas palestras o Juiz Sergio Moro, não se pode dizer até onde esse processo vai desvendar um sistema de corrupção que se tornou endêmico. Por enquanto, é a Petrobrás. Mas certamente o mesmo método comandou fundos de pensão, estatais, ou seja, toda a rede de instituições por onde circulava o dinheiro público.
Nós e o mundo todo acompanhamos atônitos o desenvolver dessa Operação Lava Jato. A drenagem do dinheiro público para empresas que superfaturavam transferindo o “plus” para pessoas e partidos políticos se constitui, por seu volume e pelo enriquecimento ilícito de pessoas e famílias, no maior roubo de verbas que deveriam financiar educação, saúde, segurança, e todos os demais serviços básicos.
Chegamos agora no momento em que o que já foi descoberto, mais o que tem que através da Justiça e das centenas de delações que ela promove ser provado, e que afeta o mundo político de modo direto, segue por dois caminhos: o de Curitiba, sede da operação, e o Supremo Tribunal Federal, para onde foram os pedidos de inquérito solicitados pela PGR e aceitos pelo relator da operação no Supremo.
O fulcro central para o pedido de Janot está nas doações eleitorais. Enfim, foram levantados os sigilos, e desde a semana passada sei porque estou citada na lista de Fachin. Enfim. Agora é hora de separar o joio do trigo, que cabe à Justiça fazer, e, com o megaesquema desvendado, fazer as mudanças no sistema político-eleitoral que permitam inverter essa fase de antipolítica e melhorar a qualidade de nossa democracia. Para ambas, estou às ordens. É o que eu e toda a população brasileira desejamos.
(*) Yeda Crusius é professora universitária, economista, comunicadora, consultora. Já foi governador do RS e ministra do Planejamento. Exerce o quarto mandato de deputada federal.
Deixe uma resposta