Entrevista exclusiva


Meio ambiente: Tripoli cobra de Dilma compromisso com acordos assinados pelo Brasil

O deputado Ricardo Tripoli (SP) foi um dos representantes do Brasil na COP 16, a conferência da ONU para debater as mudanças climáticas. Em entrevista exclusiva ao Diário Tucano/Rádio PSDB, o parlamentar fez um balanço dos resultados do evento realizado neste mês em Cancún (México). Além disso, Tripoli avaliou que o Brasil está à frente de outros países por ter um patrimônio biológico imensurável e precisa ocupar um espaço de protagonismo no cenário internacional. No entanto, o tucano teme as ações do próximo governo petista.

De acordo com o deputado, a presidente eleita, Dilma Rousseff, permitiu a ocorrência de vários problemas ambientais quando comandou uma das pastas mais importantes para o setor – o Ministério de Minas e Energia. Tripoli frisou ainda que a questão ambiental está intimamente vinculada à esfera econômica e defendeu não apenas a “preservação pela preservação”, mas a proteção pelo desenvolvimento. Confira abaixo trechos da entrevista:

Qual sua avaliação principal sobre a COP 16?
O evento de Cancún é um acontecimento que a ONU promove todos os anos para trabalharmos pela redução da emissão do efeito estufa e a questão das mudanças climáticas em função dos grandes desastres que vêm ocorrendo no mundo inteiro. Tivemos, por exemplo, tsunamis, lugares que quase não choviam com chuva abundante e lugares que choviam demais hoje têm seca. Estes são indicadores de que o mundo precisa rediscutir a questão das mudanças climáticas.

Como a delegação brasileira atuou?
No México a missão brasileira se dedicou aos encontros paralelos entre os parlamentos dos países. Nessas reuniões, há a apresentação das experiências dos países tanto no Executivo como no Legislativo, além de propostas e metas a serem discutidas durante o evento. Nos primeiros dias da COP 16, a expectativa de se chegar a um acordo era praticamente zero. São 196 países com representação e vários assuntos discutidos, inclusive ao mesmo tempo, o que dificulta os acordos. Participei, por exemplo, de reunião com a Fundação Amazônia Sustentável sobre a redução de emissão de gás carbônico com a finalidade de evitar que as florestas sejam dizimadas, tanto com desmatamento quanto por meio das queimadas.

Qual foi o foco do encontro?
Todas as discussões geraram em torno de um único conflito: como juntar o desenvolvimento com a sustentabilidade. Quais as nações que vão disponibilizar recursos para os países que precisam diminuir a emissão de gases por ter necessidade de se desenvolver e não ter disponíveis matrizes energéticas que possam ser sustentáveis. É o caso da China, que ainda opera por termelétricas e está buscando um sistema de energia nuclear por não ter recursos hídricos suficientes, sistemas eólicos e solares desenvolvidos. Será preciso buscar ajuda de outras nações.

E qual foi o principal problema na COP 16?
O país que mais induz políticas públicas nessa área hoje são os Estados Unidos. O fato de eles não firmarem o Tratado de Kioto causou um prejuízo enorme na COP 15 e se agravou na COP 16. Acontece que o Partido Republicano ganhou as eleições nos EUA, mas está sem maioria no Congresso e o presidente Obama não pode subscrever um tratado sem o apoio do seu Legislativo. Diferente do Brasil, onde o presidente envia medidas provisórias e depois o Legislativo discute e vota, nos EUA, sem autorização legislativa, não há a possibilidade de em eventos internacionais o presidente subscrever qualquer tipo de documento. Por isso, os Estados Unidos, não subscrevendo Kioto e diminuindo a participação em Cancún, faz com que haja um recuo dos países da Europa e da Ásia, embora o embaixador dos EUA tenha assegurado que o acordo de R$ 100 bilhões deve ser rateado entre os países que precisam resolver seus problemas para que não tenha um superaquecimento.

A situação de algum país específico chamou mais a atenção?
Pra que se tenha uma ideia, quando falamos sobre o Brasil, sabemos da existência de reflexos módicos em algumas regiões, mas existem países em que as dificuldades são enormes. Assisti, por exemplo, a um depoimento emocionado do representante de Tuvalu, que é um país insular e pode desaparecer em 20 anos caso tenha um aquecimento acima do esperado – e é bem possível que isso ocorra. Eles vão ter que achar uma alternativa para se realocarem no planeta.

Por isso avalio que a participação brasileira na COP 16 foi interessante, mas tenho uma preocupação muito grande. Enquanto o estado de São Paulo fez uma lei específica – e não há a possibilidade de os próximos governadores não cumprirem a lei – o governo federal apresentou apenas metas. A futura presidente, quando foi ministra de Minas e Energia, deixou que sérios problemas ambientais acontecessem. Espero, no entanto, que ela tenha repensado a sua visão sob o aspecto do meio ambiente e que esses tratados subscritos tanto na COP 15 quanto na COP 16 sejam referendados pela gestão que vai assumir a partir de 1º de janeiro.

O senhor acredita que se o governo federal tivesse algo mais impositivo como aconteceu com o governo de São Paulo o Brasil teria mais credibilidade para discutir o assunto?
Eu diria que seria um bom indicador de políticas públicas. Na COP 15 apenas dois estados apresentaram algo mais incisivo: o da California, comandado por Arnold Schwarzenegger, e o de São Paulo, que tinha José Serra à frente. SP apresentou uma lei aprovada pela Assembleia e que foi o grande mote do Brasil na COP 15. Mas também não sei se o Brasil teria condições nesse momento de apresentar algo. Espero que o próximo governo queira tomar a dianteira, porque precisamos ocupar um espaço de protagonistas nessas questões, principalmente porque temos o maior berço da biodiversidade aqui no Brasil, que é a floresta amazônica.

Alguns cientistas dizem, por exemplo, que temos mais de 18 milhões de espécies não identificadas na Amazônia e que podem conter a cura para problemas como AIDS, câncer e outras doenças. Temos, então, que valorizar esse patrimônio. Sem contar que as florestas são um grande vetor de umidade e fazem com que tenhamos um volume de chuvas capaz de atender a demanda brasileira.

O senhor conseguiria apontar alguns casos em que o Brasil está mais distante da solução e alguns em que temos soluções iminentes?
Temos alguns problemas, como o código florestal brasileiro, que foi uma conquista do povo brasileiro durante o governo FHC e não pode ser alterado. Nós, do PSDB, temos não só que defender o projeto como ressaltar a visibilidade que teve o Brasil com as alterações feitas no governo FHC, extremamente importantes para o avanço. E mais do que isso: colocar o Brasil numa condição muito boa perante o mercado internacional. Se houver alterações, vamos acabar regredindo.

O segundo aspecto é a questão da supressão de vegetação. O governo federal sempre comemora a redução do desmatamento, mas nunca indica quanto está sendo queimado da floresta amazônica. Eles dizem que desmatamento é uma coisa e queimada é outra, e na verdade a supressão é a mesma porque se perde biodiversidade das florestas. Isso não só na mata atlântica, mas no cerrado, na caatinga e nos mais diversos tipos de florestas e esse é um problema muito sério.

Como o país deve se posicionar na próxima conferência da ONU?
O Brasil é hoje o quinto ou sexto emissor de poluição por conta das queimadas de florestas. E não são indústrias nem automóveis os responsáveis, mas o extermínio das nossas florestas. O Brasil, para se colocar à frente na COP 17 ano que vem, na África, vai ter de apresentar resultados do que foi proposto em Kioto, pois os compromissos devem começar em 2012. Além disso, teremos no Brasil o Rio +10, 20 anos após a ECO 92. Vamos ter que apresentar um saldo de contas positivo do que o Brasil fez nesse período e o código florestal é exatamente um desses itens que teremos. Caso seja modificado, teremos um prejuízo enorme para apresentar aos países que aqui virão.

Dentro dos BRICs, o senhor acredita que falta muito ao Brasil para avançar?
Levamos algumas vantagens no que diz respeito aos Brics. A Índia, a China e a Rússia enfrentam ainda algumas dificuldades que não temos aqui. O Brasil tem 12% de água doce do planeta, o que é um patrimônio incalculável, pois o ser humano vive sem petróleo, mas não sem água. O fato de termos 12% da água doce do planeta é um patrimônio imensurável – o que coloca o Brasil na dianteira não só sob o aspecto de a água dar sobrevida ao ser humano, mas na questão energética, pois cerca de 80% da nossa energia é movida pelo sistema hídrico. Sem contar os aquíferos que passam pelo Brasil e ainda poderemos absorvê-los. E temos ainda uma terceira questão: a geração de energia. De acordo com alguns cientistas, se repotencializarmos nossas turbinas, teremos uma geração de energia de 20% a mais apenas com o aprimoramento dos nossos equipamentos. Nesta questão, o Brasil leva imensa vantagem sobre os outros países dos Brics, pois eles não têm esse volume de água nem o volume de florestas que temos aqui. Por isso, acho que temos um patrimônio fantástico a ser explorado de forma sustentável, além de termos condição de oferecer isso para o mundo.

O Brasil precisa ainda aprimorar suas leis e sugestões para a COP 17? Isso vai ser feito no Legislativo?
Esse é um conjunto de coisas. O Legislativo pode ajudar muito na elaboração e no aperfeiçoamento da nossa legislação, mas isso tem de ser feito com envolvimento maior da classe científica, que é efetivamente quem vai quantificar o volume de espécies ainda não identificadas e de que maneira vamos absorver as chuvas. É preciso haver um investimento maior na parte científica para que o Brasil possa cumprir algumas metas e quando tivermos a Rio+20 apresentarmos ao mundo soluções de problemas que o planeta não conseguiu encontrar. Ainda vamos cobrar dos países chamados desenvolvidos os royalties que o Brasil deve receber pelo patrimônio que temos ainda preservado no nosso país. São duas questões importantes: assegurar que nosso patrimônio seja mantido e questionar de que maneira teremos a contrapartida dos países desenvolvidos por termos esse patrimônio biológico.

O senhor acredita que há espaço para ampliação de parcerias público-privadas?
Totalmente. Se olharmos as áreas de preservação permanentes e intocáveis no Brasil, boa parte delas são propriedades privadas. E isso, no mercado internacional, é dinheiro. Se um determinado proprietário souber que sua área, preservada pode ter retorno no mercado internacional, com bônus e recursos, em cinco ou dez anos teremos retorno financeiro e econômico. Portanto, quem tiver juízo e mantiver suas áreas intactas terá dinheiro no futuro. A questão ambiental está intimamente vinculada à questão econômica e as pessoas não estão percebendo que perdem dinheiro no momento em que se queima ou se desmata uma floresta. Outra coisa que não é vantajosa é o avanço da fronteira agrícola para cima da floresta. Nosso território é muito grande e já temos áreas degradadas que podem ser utilizadas para o plantio e a criação de animais, deixando que o cinturão da nossa floresta amazônica seja explorada pela comunidade científica, com suporte de mão de obra local. Isso dará condições, inclusive, para o desenvolvimento da comunidade local. Não queremos apenas a preservação pela preservação, mas a preservação pelo desenvolvimento.

(Reportagem: Thais Antonelli/ Foto: Ag. Câmara)

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15 dezembro, 2010 Últimas notícias 1 Commentário »

Uma resposta para “Entrevista exclusiva”

  1. Wilfried Krambeck disse:

    Muito esclarecedora e de divulgação urgente esta entrevista. As atitudes do futuro Executivo e da maioria do Legislativo no Brasil são fundamentais para a preservação do que é da nossa alçada neste processo mundial de preservação da natureza e sua relação com o desenvolvimento sustentável. Eu – particularmente – não acredito numa atuação diferenciada da Sra. Dilma com relação à atuação de seu “ídolo” Sr. Lula, este que – meramente – empenhou-se em beneficiar a todo custo “cumpanheiros” do MST (organização legalmente inexistente – diga-se de passagem!?!?!), inflando-os de direitos de ocupação criminosa de propriedades privadas sem contrapartida alguma de trabalho e resultados e milionarizando financeiramente suas “lideranças” – quer seja via cargos governamentais ou diretamente via repasses seletivos e direcionados de dinheiro público (leia-se: dinheiro do POVO!). Então, considerado que o “mestre” se propôs a incentivar a ocupação ilegal, destrutiva e mal-intencionada de áreas produtivas que incluem áreas de preservação legal, o que podemos esperar de melhor daquela que se diz sua “aprendiz”?!?!?…. mas vamos torcer por uma surpresa positiva, a esperança é a última que morre – diz o ditado popular….

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