O Congresso e a regulamentação dos aplicativos, por Marcus Pestana


No mundo inteiro se instalou uma enorme polêmica sobre os aplicativos de transporte (Uber, Cabify, 99, entre outros), que concorrem com os táxis. No Brasil não foi diferente. E a discussão chegou ao Congresso por meio de projeto de lei nascido na Câmara dos Deputados, emendado pelo Senado e revisto pelos deputados na última quarta-feira.

Os impactos dos avanços da tecnologia na vida da sociedade sempre geraram embates em torno de interesses setoriais que se chocavam com as inovações que aumentavam a produtividade. Na Revolução Industrial, o movimento operário chegou a patrocinar a quebra de máquinas em protesto contra o “desemprego tecnológico”. Quando foram introduzidos os caixas eletrônicos nos bancos, houve resistências sindicais diante da inevitável “queima de empregos”. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso tem dito que talvez o maior desafio contemporâneo seja exatamente a combinação do avanço tecnológico com a garantia do emprego. O grande economista austríaco Joseph Schumpeter caracterizou esse fenômeno como um processo de inovação, destruição criadora e desenvolvimento.

Há muitas ideias ingênuas, verdadeiras “utopias regressivas”, que sonham com a calma de um Estado quase estacionário, em que o equilíbrio seria resultado do congelamento das inovações. Tolo engano. A história da humanidade é uma travessia de eternos desequilíbrios e conflitos determinando rupturas e avanços.

O poder público tem o dever de assegurar um serviço de transporte que garanta a mobilidade (ônibus, metrô, táxi). Por razões urbanísticas, econômicas e ambientais, deve procurar eficiência para desestimular o transporte individual. A competição no capitalismo, em todos os setores, é a maior arma de defesa de consumidores, usuários de serviços e cidadãos.

O sistema de táxi surge como uma das respostas para o desafio. É uma permissão concedida pelo poder público municipal. Os taxistas têm vantagens e desvantagens. Têm uma série de obrigações contratuais. Por outro lado, usufruem de isenções tributárias e garantem maior agilidade, utilizando as vias preferenciais de tráfego.

Os aplicativos surgiram como solução na órbita privada, sem interveniência do poder público. Também têm vantagens e desvantagens.

As instituições federais em Brasília têm, historicamente, um cacoete centralizador e paternalista, num Brasil continental, desigual, diverso. Há sempre a tentação de gerar soluções únicas que se tornam verdadeiras camisas de força para realidades díspares.

Ao aprovar o relatório do deputado Daniel Coelho (PSDB-PE), a Câmara apostou corretamente na descentralização, no empoderamento do poder local para regulamentar, nas condições concretas de cada cidade, com amplo debate social, a melhor solução. Os sistemas municipais são diferenciados. Alguns têm metrô, outros não. Alguns têm bons serviços de táxi, outros não.

A decisão foi correta: nem impediu a inovação, nem lavou as mãos diante da necessária regulamentação dos aplicativos. 

(*) Marcus Pestana é deputado federal pelo PSDB-MG. Artigo publicado no jornal “O Tempo” em 05/3. (foto: Alexssandro Loyola)

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5 março, 2018 Artigosblog Sem commentários »

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