Medidas extremas, por Miguel Haddad
Em 1961, ao ser designado primeiro-ministro do governo parlamentarista de João Goulart, Tancredo Neves pediu ao economista Roberto Campos – que conta esse episódio em seu discurso de despedida da Câmara dos Deputados – que preparasse, no prazo de duas semanas, um plano de governo para ser referendado pelo Parlamento. Campos reagiu, dizendo ser impossível preparar um documento de tal envergadura em prazo tão exíguo. Tancredo lhe respondeu com sarcasmo, dizendo que o economista “era useiro e vezeiro em fabricar programas de governo, desde os tempos de Getúlio e Juscelino” e que “no Brasil, os problemas não mudam; logo não mudam também as soluções”.
Daí nasceu – continua Roberto Campos – o programa denominado programa das tesouras, “feito com recortes de textos antigos que tinham permanecido insolentemente atuais, demonstrando a nossa incapacidade de transformar crises em oportunidades, aspirações em realidades”, finaliza o economista. Problemas que não são resolvidos na raiz, não desaparecem. Vão se avolumando. Adiar a tomada de providências necessárias significa apenas transferir para as gerações futuras desafios ainda maiores do que os que enfrentamos no presente.
A multiplicidade de crises que vivemos hoje, na economia, na política e na segurança, mostra que não é mais possível enxugar gelo. O caso da segurança pública é exemplar. Ao longo de anos, o poder das facções criminosas, alimentado principalmente pelo lucro do tráfico de drogas, não parou de crescer, deixando claro que a estratégia até agora adotada para enfrentar essa questão não se sustenta. Temos hoje regiões inteiras dominadas, sujeitas a leis impostas pelo crime. No Rio de Janeiro, e em várias outras cidades brasileiras, a população tornou-se refém das facções. Não há, de imediato, como conter o crescimento desse Estado Paralelo sem medidas extremas, como a intervenção ora em andamento, no Rio, que, inevitavelmente, será dura e violenta. Mas frente a essa situação, é preciso ir além e entender que a falência da segurança é, primordialmente, consequência do equívoco da legislação atual. Temos de rever nosso ponto de vista e focar no centro do alvo: o que importa é o desmantelamento das facções criminosas. Vai ser duro, vai ser difícil, teremos de desafiar interesses e conceitos arraigados, mas, antes de tudo, precisamos tomar as providências necessárias para vencer essa guerra.
(*) Miguel Haddad é deputado federal e já foi prefeito de Jundiaí. Artigo publicado no “Jornal de Jundiaí”.
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