2018 saúda o povo e pede passagem, por Marcus Pestana
Já virou lugar-comum dizer que a vida só começa depois do Carnaval. Parece um processo catártico coletivo que compreende a metabolização da herança do ano anterior e a explosão das expectativas para o ano que se inicia. Isso transborda no Carnaval, quando cada um pode ser o que não é, fantasiar a realidade e esculachar autoridades, pop stars e adversários eleitos como alvo. No sambódromo do Rio, poesia, lirismo, tradições e sátiras políticas levantam as arquibancadas. A sensação de orfandade da população nos dias atuais ganha uma tradução no belíssimo samba-enredo da Beija- Flor.
Mas, tiradas as fantasias na Quarta-Feira de Cinzas, não há como não encarar nossa complexa realidade. É evidente que é melhor viver de fantasia, sonho e poesia. Mas é preciso navegar.
Menos de oito meses nos separam da mais complicada e misteriosa eleição da história recente do Brasil. Será um divisor de águas. A Nova República encontrará seu fecho. Não aquele sonhado por seus fundadores, Tancredo Neves, Ulysses Guimarães e Franco Montoro. Mas aquele resultante de nossas mazelas e erros acumulados nas últimas décadas.
A Constituição Cidadã, como quis Ulysses, completa 30 anos. Nem por isso consolidamos o Brasil justo, democrático e próspero que sonhávamos.
O fundamental é que superemos a profunda instabilidade política que preside nossas vidas desde 2015 e transformemos o caldo de cultura de intolerância que dela resultou em reconstrução dos canais de diálogo. Que coxinhas e mortadelas, bolsomitos e comunistas, tucanos, liberais, conservadores e petistas consigam se xingar menos, ouvir e dialogar mais a partir das diferenças legítimas.
O Brasil precisa de um pouco de paz e calma para trabalhar e enfrentar desafios como o ajuste fiscal inadiável e a revolução educacional. O futuro presidente, mais do que um super-homem, tem que ter serenidade, capacidade de diálogo e experiência para liderar um novo ciclo na história brasileira.
Faltam menos de oito meses. Não sabemos ainda se haverá candidatos outsiders. Nem qual será a escolha do PT. Muito menos se o fenômeno Bolsonaro se sustentará. E ainda se o centro político-democrático se unificará. Mas é daí que nascerá nosso futuro.
Nas redes sociais, cenas explícitas de pugilato virtual predominam, e esculhambar os políticos é o esporte predileto. Mas sem política não existe democracia. Sem democracia não há esperança e futuro possível.
A representação é um raio X imperfeito – mas o possível – da opinião da sociedade. No exercício radical da malhação de Judas permanente contra as lideranças políticas se esquece de que todos estão lá pelo voto da população. É um narcisismo invertido. Olhamos para os representantes que elegemos, e não gostamos, e preferimos não enxergá-los como espelho de nossas decisões.
Dois mil e dezoito pede passagem! Que de nossas mãos sábias e serenas nasça um Brasil tão generoso como aquele sonhado pelos fundadores da Nova República, que agora se despede.
Deixe uma resposta