O aprendizado permanente nas políticas de saúde, por Marcus Pestana
Em boa hora, a Câmara dos Deputados firmou acordo de cooperação técnica com os governos espanhol e português para troca de experiências sobre a gestão de seus sistemas de saúde. Resultado disso foi o envio de uma delegação a Madri e Lisboa para estudar os impactos da recente crise europeia na saúde pública.
Digo em boa hora porque a política brasileira tem andado mais perto dos constantes casos de corrupção e mais distante daquilo que interessa a todos: a melhoria da qualidade de vida a partir de políticas públicas consistentes.
Vamos às semelhanças entre Brasil e Espanha. Os dois países ergueram sistemas de saúde gratuitos baseados no Estado de bem-estar social, lançando os dois pilares da organização da atenção à saúde: a universalidade (o acesso é para todos, sem restrições) e a integralidade (a carteira de serviços deveria cobrir integralmente as necessidades da população). A configuração dos dois foi expressão da transição para a democracia após ditaduras. A Espanha em 1978, já o Brasil com a Constituição de 1988.
Mas há diferenças importantes. Primeiro, os padrões de financiamento. Enquanto cada região autônoma espanhola tem para investir na saúde pública, em média, 1.300 por habitante/ano, no Brasil temos apenas 300 per capita. Em segundo lugar, na Espanha há uma carteira de serviços definida em um decreto real e por normas ministeriais. Um exemplo: aparelhos para correção de problemas de audição só são ofertados até os 16 anos. Resultado: não há judicialização como no Brasil. Outra diferença, somente 8% da população tem algum tipo de assistência privada.
Visitamos o Hospital Universitário Puerta de Hierro Majadahonda, referência para 380 mil pessoas, mas que também atende a outras regiões em segmentos de complexidade como transplante, oncologia e cirurgia cardíaca. Confesso que a estrutura arquitetônica me surpreendeu. Mais parece um shopping, tão espaçoso que é e tal a qualidade do acabamento. O modelo de construção e gestão é uma parceria com o setor privado. O setor público cuida de saúde, o setor privado, de construir, “alugar” e prover serviços de apoio.
Fomos também ao Centro de Salud Fuentelarreina para conhecer o fantástico trabalho de atenção primária. Lá, dez médicos e dez enfermeiros cuidam de 22 mil vidas. Interessante observar que os médicos espanhóis ganham, por sete horas de trabalho e dedicação exclusiva, de 3.000 a 4.000, ou seja, de R$ 12 mil a R$ 16 mil mensais.
Nem tudo são flores. A profunda crise espanhola de 2008 impactou a saúde. Salários foram rebaixados, fornecedores enfrentaram enormes atrasos, carreiras profissionais ficaram congeladas. A principal medida foi o copagamento dos medicamentos. O cidadão banca até 60% do custo dos remédios, conforme a situação financeira individual. O restante continua gratuito.
O SUS, apesar de enormes avanços, no formato atual é insustentável e precisa de mudanças. E nada como conhecer experiências avançadas para não reinventar a roda a cada minuto.
(*) Marcus Pestana é deputado federal pelo PSDB-MG. Artigo publicado no jornal “O Tempo” em 12/02. (foto: Alexssandro Loyola)
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