Parlamentares do PSDB veem jogo duplo na atuação de ex-procurador na delação da JBS
O ex-procurador do Ministério Público Federal Marcelo Miller prestou depoimento nesta quarta-feira (29) à CPMI da JBS e tentou explicar sua atuação na delação dos empresários da J&F, controladora da JBS. Ele é acusado de ter atuado a favor da JBS durante o processo de assinatura de delação. Documentos trocados entre Miller e integrantes do escritório que o contratou comprovariam o “jogo duplo” no caso. Durante a longa oitiva, ele rebateu as supostas provas e disse ter mantido diálogos com a J&F antes de deixar o cargo que ocupava, mas sem se atentar para as interpretações que isso poderia suscitar.
LAMBANÇA
Questionado pelo deputado Izalci (DF), Miller admitiu ter mantido contato com os empresários e advogados da J&F antes mesmo de deixar o Ministério Público e da delação do grupo ser feita. Ele negou, porém, que tenha cometido crime, mas admitiu “um erro brutal de avaliação”, uma “lambança”.
Sobre sua participação em um grupo de WhatsApp, criando antes de deixar o cargo de procurador, junto com os executivos e advogados da empresa, Miller disse ao tucano que, de fato, foi algo impróprio, mas não ilícito, e desafiou os parlamentares a provarem que a conduta tenha sido criminosa. Miller ainda negou que tenha sido braço-direito do ex-procurador-geral Rodrigo Janot e negou que tenha mandado delatores gravarem diálogos com delatados, inclusive o presidente Michel Temer.
Mas para Izalci, o ex-procurador não convenceu. “Na prática ele assumiu que teria ajudado no período anterior ao desligamento do Ministério Público. Disse que não recebeu nada por isso, mas eu apresentei e-mail escrito por ele mesmo no qual definia as horas trabalhadas em março, quando ainda era do Ministério Público. Houve pagamento em maio. Ele disse que foi referente ao período abril a junho. Mas isso não convence. Ninguém trabalha com essa intensidade de graça”, rebateu o deputado após a oitiva.
Miller começou a trabalhar oficialmente para o escritório Trench, Rossi e Watanabe Advogados, que tinha a J&F como cliente, logo após sua saída. Ainda assim, afirmou à CPI que não traiu o Ministério Público. Para Izalci, permanece nítida a impressão de que Miller atuou nos dois lados do balcão, orientando a J&F quando ainda era do membro do MP.
FALTA DE ÉTICA
“É no mínimo uma falta de ética. Como pode ele ser membro do MP e prestar consultoria para empresa que está sendo investigada e com proposta de delação premiada? É uma incoerência. Ele disse que não, mas vejo que o papel dele na delação foi fundamental e a orientação partiu dele. O pessoal [da J&F] sentiu segurança com ele. Lógico que ele teve uma contribuição forte na definição da delação. E depois ele foi fundamental na leniência nos EUA”, apontou Izalci.
O tucano afirma que pode ter partido de Miller a orientação de gravações como as que foram feitas por Joesley Batista com o presidente Michel Temer. O deputado afirma que há fatos coincidentes nesse caso com o da delação do ex-presidente da Transpetro Sergio Machado, onde também houve gravação clandestina, um deles é a atuação da advogada [e amiga de Miller] Fernanda Tórtima. Izalci acredita ser possível que outros membros do Ministério Público, inclusive o ex-procurador-geral Rodrigo Janot, sabiam da dupla atuação de Miller. “Não tem como não saberem”.
O deputado João Gualberto (BA) também apontou as incoerências da atuação de Miller. “O que ele cometeu foi ilegalidade, imoralidade, falta de ética. Eu, no lugar do Janot, também pediria sua prisão. Joesley não lhe contratou apenas pela competência, mas porque tinha ciência de que sabia de muita coisa, pois conhecia o Ministério Público”, disse o tucano ao depoente.
O parlamentar ressaltou que Miller entrou no grupo de WhatsApp no qual estavam Ricardo Saud, Joesley e Wesley Batista e a advogada Fernanda Tótima, dias antes de se desligar do Ministério Público. A alegação de Miller é que ele só mandou a primeira mensagem no grupo após o desligamento do órgão. “Isso não quer dizer nada. Já estava lá, tinha vínculo, amizade. Por que não saiu quando o colocaram?”, indagou Gualberto.
CONVOCAÇÃO DE LULA
Apesar do jogo duplo que teria sido praticado pelo ex-procurador, Gualberto afirma que Miller é um dos personagens periféricos de um esquema que comanda a corrupção no Brasil e que tem à frente um grupo de políticos, que precisam ser desmascarados. O tucano lamentou a falta de quórum na sessão desta quarta-feira para votar requerimentos de sua autoria que pretendem convocar, entre outros, o ex-presidente Lula.
Para ele, a CPMI perdeu o “timing” para convocar políticos e realizar acareações, como a de Joesley com Lula. “O fato é que eu esperava apurar a corrupção, quem são os corruptores, os agentes políticos que fazem parte, pois se os mesmos continuarem governando, logo teremos novos Joesleys, Eikes e procuradores envolvidos”, alertou.
(Reportagem: Djan Moreno/foto: Geraldo Magela/Agência Senado)
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