O Brasil em tempos de cólera, por Marcus Pestana
Embora a economia esteja retomando seu ritmo de crescimento, as instituições funcionando plenamente e a democracia consolidada no país, não há como negar que vivemos momentos turbulentos e de grande instabilidade política, em que predominam a intolerância, o radicalismo e a obstrução dos canais de diálogo.
Como desde os 16 anos aprendi com Tancredo Neves, Ulysses Guimarães, Mário Covas e Itamar Franco, entre outros, que a política é a arte de construir consensos a partir da diversidade e do pluralismo presentes na sociedade, erguendo convergências nascidas do debate franco e aberto das divergências, vejo com apreensão os atuais descaminhos de nosso processo político.
Independentemente dos pontos de vista, dos paradigmas ideológicos e das posições políticas de cada um, havendo honestidade intelectual, disponibilidade para ouvir os diferentes, espírito público, valores éticos e objetivos coletivos, sempre é possível conseguir a unidade na ação transformadora, sem sacrifício das identidades individuais ou de grupo.
Infelizmente, o impeachment de Dilma, o devastador tsunami político desencadeado por tudo que a Lava Jato está apurando, o desarranjo institucional entre os Poderes republicanos, a explosão nas redes sociais de toda sorte de maniqueísmos e sectarismos semeiam sementes perigosas que podem frutificar em aventuras autoritárias e na atrofia de nossa democracia.
Em tempos de nevoeiro intenso, é melhor seguir o conselho do grande sambista e levar o barco devagar. Aprendi também com os velhos líderes da redemocratização que um bom homem público precisa agir com serenidade, firmeza e convicção.
Tenho procurado ouvir muitos amigos que possam me ajudar a refletir sobre este momento tão complexo, turbulento e perigoso de nosso país, que me oferecerem outro olhar, longe do clima viciado que impera hoje no Congresso Nacional e na sociedade.
Foi o caso da conversa com o amigo e economista Paulo Brant, que com sua vasta cultura e ampla sensibilidade jogou luzes que me ajudaram muito a avançar na compreensão da realidade brasileira. A partir da frase do filósofo francês André Conte Sponville, “toda virtude é um ápice entre dois vícios, uma cumeada entre dois abismos”, desdobrou sua reflexão de que, diante de tamanha crise multilateral, a apatia seria desastrosa, mas também a cólera não seria uma boa conselheira para a sociedade brasileira. E concluiu que temos que libertar as pessoas dessa verdadeira “guerra civil” eivada de radicalismos, citando seu irmão Roberto: “Pobre do país cujos heróis são promotores que acusam e juízes que condenam, e não engenheiros que constroem, professores que ensinam e médicos que curam”.
Que a sabedoria da família Brant possa inspirar-nos a todos para que, num debate franco e aberto, consigamos recolocar o Brasil nos trilhos.
(*) Marcus Pestana é deputado federal pelo PSDB-MG. Artigo publicado no jornal “O Tempo” em 30/10.
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