Reformar a Previdência, sim, mas como?, por Aécio Neves
A reforma da Previdência caminha para a hora da verdade. O tema é sensível, de repercussões e impactos duradouros. O momento exige zelo redobrado.
Como em qualquer processo reformista, a proposta original não pode ser tomada como intocável. Em ocasiões como essa, é do debate aberto e plural que podem sair as melhores respostas.
Mas a discussão precisa ser, acima de tudo, honesta, responsável, orientada por espírito público. O que está em jogo é o futuro do país, não querelas partidárias. Reforma da Previdência não se confunde com agenda de governo; é assunto de Estado.
Considero a proposta encaminhada pelo Executivo ao Congresso boa em vários aspectos. O primeiro e central deles é a instituição de uma idade mínima para aposentadoria. Em todo o mundo, todos os sistemas sólidos têm essa característica.
Outro pilar da reforma é a unificação de regras, acabando com as exceções que hoje caracterizam a nossa Previdência e que terminam por perpetuar vantagens, não por promover maior justiça social. Essa, aliás, deve ser a maior premissa da reforma: ser justa e sustentável ao longo do tempo.
Os aspectos positivos não desautorizam, contudo, a necessidade de ajustes no texto.
Um deles, que já defendi neste espaço, é a manutenção das regras do Benefício de Prestação Continuada que protege idosos e pessoas com deficiência de baixa renda. Outro é a adoção de uma regra de transição mais suave para aqueles segurados que já estão no sistema.
A esses pontos somam-se dois aspectos que precisam ser debatidos: a aposentadoria rural e a hipótese de uma idade menor para aposentadoria das mulheres —ainda que por tempo definido— em função de distorções como a apontada pelo IPEA, com base na Pnad, que demonstra que a mulher tem carga de trabalho de 30 horas a mais por mês que o homem.
Mas há condições irrefutáveis que devem iluminar qualquer debate. Não há argumento que eclipse a constatação de que o modelo atual é insustentável no tempo. Os rombos estão aí para todo mundo ver, e são crescentes.
As mudanças nas condições de vida também não deixam margem a dúvidas. A cada ano, nascem menos brasileiros; a cada ano, os brasileiros, felizmente, vivem mais. Para uma Previdência já bastante desequilibrada, essa dinâmica demográfica é simplesmente fatal. Mudar é, portanto, imperativo, não ato de escolha.
O Brasil não pode adiar o encontro com a verdade, não pode continuar evitando olhar-se no espelho. Nos últimos anos, a tônica prevalecente no país foi ignorar a realidade. Custou-nos muito caro. Antes que fique impagável, é preciso agir. A hora é esta. O resto é enganação ou o flerte irresponsável com o caos.
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