Em defesa da Lei Rouanet, por Domingos Sávio 


Como relator da CPI da Lei Rouanet, estou tendo a oportunidade de debater com vários setores os aprimoramentos que se fazem necessários para preservar e ampliar este importante instrumento de fomento e incentivo às manifestações artísticas e culturais do país. Tenho defendido, por exemplo, a criação de mecanismos que garantam maior transparência na escolha e na execução de projetos. Parto do princípio de que as empresas são parceiras nesse processo, mas o dinheiro que elas repassam é, na realidade, recursos que seriam destinados ao pagamento de impostos. São, portanto, recursos públicos e como tal devem ser tratados.

A Lei Federal de Incentivo à Cultura, mais conhecida como Lei Rouanet, é boa e necessária. O problema é que existem aqueles que se aproveitam de fragilidades no sistema para desviar o já escasso dinheiro público destinado à cultura. A cada novo depoimento, fica mais claro para os integrantes da CPI que existe um esquema, com a participação de empresas e de alguns pseudopromotores culturais, utilizado para desviar recursos que deveriam ser aplicados, necessariamente, em projetos culturais. Conseguimos detectar que boa parte do dinheiro dos impostos que as empresas deixam de pagar e aplicam via Lei Rouanet veio sendo, ao longo dos anos, objeto de desvios graúdos. Apenas um grupo de São Paulo desviou pelo menos R$ 100 milhões. Um dos projetos dizia no papel que os recursos captados seriam aplicados no financiamento de apresentações gratuitas de uma orquestra sinfônica, visando popularizar essa importante expressão musical, mas, na realidade, o dinheiro foi utilizado para bancar o luxuoso casamento de um filho do dono da empresa que captou o patrocínio.

Embora minoritários, é fato que tais desvios colocam em xeque a credibilidade da Lei Rouanet. Além de punir aqueles que desviam ou utilizam de forma indevida recursos captados por meio da renúncia fiscal, outro aspecto é que nós precisamos fazer com que essa legislação volte a inspirar credibilidade e confiança, para que as empresas possam investir, mas de maneira correta, gerando oportunidades para que os cidadãos comuns tenham mais acesso à cultura, para que os artistas iniciantes possam ter seus projetos financiados e também para viabilizar uma infinidade de bons projetos que associam cultura à educação e à promoção social.

Outra distorção da Lei Rouanet, que precisa ser corrigida, está no fato de que ela vem sendo utilizada por alguns artistas já consagrados para a realização de eventos altamente lucrativos, inclusive cobrando ingressos, apesar de serem financiados com dinheiro público. Não é esse o propósito desta lei. Como os recursos são escassos, não é justo deixarmos de assistir àqueles artistas que nem sequer tiveram oportunidade de gravar seu primeiro CD, de fazer o seu primeiro concerto, de publicar o seu primeiro livro ou de montar sua peça de teatro para gastar milhões de reais com um artista já famoso, simplesmente porque ele teve a capacidade de persuadir um político ou um empresário, que o apadrinhou para a liberação de patrocínios.

Não podemos permitir também que cerca de 90% dos recursos captados via Lei Rouanet fiquem limitados a um segmento ou a uma região do país. É fundamental que os projetos beneficiados pela renúncia fiscal contemplem todas as regiões brasileiras e apoiem, desde a chamada “cultura de raiz”, até setores culturais mais complexos, como a produção cinematográfica. Para isso, é fundamental que a liberação de recursos seja mais descentralizada e democratizada. Um dos nossos objetivos na CPI é exatamente identificar falhas na legislação vigente para aperfeiçoá-la. Além disso, é igualmente fundamental tornar a liberação de recursos via Lei Rouanet mais eficiente e mais transparente, para que este mecanismo fomente de forma democrática a cultura brasileira, em todas as suas expressões e em todos os rincões do país.

(*) O deputado Domingos Sávio é presidente do PSDB-MG e relator da CPI da Lei Rouanet. (foto: Alexssandro Loyola)

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15 fevereiro, 2017 Artigosblog Sem commentários »

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