Reta final
Relator do impeachment aponta “atentado à Constituição” e recomenda prosseguimento do processo
O relatório do senador Antonio Anastasia, apresentado nesta terça-feira (2), na Comissão Especial de Impeachment do Senado Federal, aponta que há provas de autoria da presidente Dilma Rousseff, por ação direta ou por omissão, nos crimes de responsabilidade por abertura de créditos suplementares sem autorização do Congresso Nacional e pela realização das chamadas “pedaladas fiscais” (operação de crédito com instituição financeira controlada pela União). Por esses fatos, o voto do senador foi pela continuidade do julgamento pelo Plenário do Senado.
A decisão foi embasada em evidências registradas no processo que colheu o depoimento de 44 depoentes, dos quais 38 indicados pela defesa da presidente afastada. Foram analisados também 171 documentos, entre eles, relatórios oficiais de órgãos públicos, laudos técnicos elaborados pela Junta Pericial e análises da Defesa e da Acusação. No conjunto desse material, inclusive em manifestação da própria presidente Dilma Rousseff e de seus auxiliares diretos, ficaram provados crimes de responsabilidade contra a lei orçamentária e crimes contra a guarda e legal emprego dos dinheiros públicos (artigos 10 e 11 da Lei 1.079).
“A gravidade dos fatos constatados não deixa dúvidas quanto à existência não de meras formalidades contábeis, mas de um autêntico ‘atentado à Constituição’”, afirma Anastasia em seu relatório. O parecer destaca ainda o manifesto descumprimento das leis por meio da “ação coordenada” de órgãos e entidades de cúpula da Administração Superior, o que jamais ocorreria, no contexto examinado, sem o conhecimento do comando central do Governo.
DECRETOS SUPLEMENTARES
Segundo o relatório, três dos quatro decretos suplementares analisados pela Comissão Especial do Impeachment do Senado e assinados pela presidente Dilma promoveram alterações na programação orçamentária incompatível com a obtenção da meta de resultado primário vigente à época. Isso foi apontado pelo próprio laudo da Junta Pericial, constituída a partir de pedido da Defesa, com impacto negativo de R$1,75 bilhão. Ocorre que o artigo 4º da Lei Orçamentária Anual (LOA 2015) permitia a edição desses decretos apenas se as alterações promovidas fossem compatíveis com a obtenção da meta de resultado primário estabelecida.
Para o relator, no momento da assinatura dos decretos, a presidente Dilma tinha plena consciência de que a meta de resultado primário fixada para o exercício não seria cumprida, o que revela conduta irresponsável, incompatíveis com o cargo de quem deveria cuidar do equilíbrio das contas públicas. O relatório mostra que, em julho de 2015, o contingenciamento proposto pelo Governo levou em consideração a proposta de meta de R$5,8 bilhões (que só veio a ser aprovada em dezembro daquele ano) e não a meta da Lei vigente àquele momento de R$55,3 bilhões. Mesmo assim, ciente do fato, a presidente assinou decretos de suplementação, sem autorização do Congresso e em confronto com a meta vigente.
“Ao abrir créditos suplementares e contingenciar despesas com base em projeto de lei pendente da apreciação do Parlamento, a Presidente da República revelou, portanto, não apenas desconsideração pelos mais elementares princípios de responsabilidade fiscal, mas absoluto desrespeito ao Congresso Nacional. No regime presidencialista, não se admite que o Executivo adote ou altere a política fiscal à revelia do Legislativo”, ressalta o relatório do senador Anastasia.
OPERAÇÕES DE CRÉDITO ILEGAIS
O relatório também demonstra que a omissão da presidente Dilma Rousseff permitiu o financiamento de despesas primárias pelo Banco do Brasil por meio de operação de crédito, ação vedada pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Segundo o documento, o comportamento foi deliberado, sendo os passivos do Tesouro com os bancos públicos impossíveis de serem saldados sem a participação direta da presidente. Anastasia também chama a atenção para o fato de as chamadas “pedaladas fiscais” terem sido ocultadas da contabilidade pública ao longo dos anos, identificadas somente depois da investigação do TCU e de denúncias veiculadas pela imprensa.
A análise dos documentos e as provas colhidas durante a fase de instrução mostram que durante todo o ano de 2015 o Governo beneficiou-se do financiamento de despesas primárias pelo Banco do Brasil e somente em 2016 a existência de passivos acumulados em anos anteriores foi tornada pública. Reafirmando o laudo pericial, Anastasia destaca que a relação constatada no caso dos atrasos no Plano Safra (desde 2008), tratou-se efetivamente de uma operação de crédito da qual, mesmo tendo conhecimento, Dilma não tomou providências para evitar. Isso é demonstrado no relatório quando verificado que, mesmo acumulados, ao final de 2014, R$ 10,9 bilhões, a Lei Orçamentária de 2015 previu apenas R$ 8,44 bilhões para o pagamento de equalizações de taxa de juros ao Banco.
A irresponsabilidade da Presidente na direção superior da Administração Federal fica clara, ainda, pelo comportamento leniente do Banco do Brasil, do Banco Central e da Comissão de Valores Mobiliários diante da inadimplência do Tesouro Nacional, revela o documento. “O comportamento do Banco do Brasil é prova cabal da influência indevida da União, na qualidade de acionista controladora. O que explica que uma instituição financeira, credora de mais de R$ 10 bilhões em atraso, aceite ampliar em 20%, por determinação do devedor, a linha de crédito que originou esse passivo? Por que essa dívida, que acumulava valores devidos desde 2008, nunca foi cobrada em juízo?”, questiona Anastasia.
O relatório chama a atenção ainda para o fato de que em nenhum momento, durante todo o processo, a presidente Dilma negou ter conhecimento da existência dos passivos bilionários acumulados e que, mesmo depois de advertida por seus ministros da existência desses passivos, ela anunciou a aplicação em 20% dos recursos do Plano Safra, tendo sua participação direta sido confirmada pelo próprio vice-presidente do Banco do Brasil. Apresentando declarações da própria presidente em cerimônias públicas, o relatório ressalta que Dilma tinha pleno conhecimento das pedaladas e concordava com a prática.
“O que se constata, portanto, é que a acusada foi irresponsável não apenas na omissão quanto ao seu dever de coibir essas graves irregularidades, mas também na adoção de providências de sua competência exclusiva e na direção superior da Administração Federal. A Presidente da República era a pessoa em toda a cadeia administrativa que detinha o poder definitivo de mudar a rota da ação lesiva, mas não o fez”, conclui o senador Anastasia em seu relatório.
O parecer será discutido na quarta-feira (03/08) na própria Comissão e votado na quinta-feira (04/08). Após essa etapa, seguirá para leitura e apreciação do Plenário.
(Da assessoria do senador, com alterações)
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