Vergonha nacional

Tucanos cobram esclarecimentos de Foster sobre malfeitos na Petrobras e criticam manobras do governo

Na tumultuada audiência desta quarta-feira (11) da CPI Mista da Petrobras, deputados do PSDB cobraram da presidente da estatal, Graça Foster, esclarecimentos sobre a negociação nebulosa da refinaria de Pasadena (EUA), os altos investimentos na obra de construção de Abreu e Lima, em Pernambuco, e a venda de ativos da petroleira na África. Pressionada pela oposição, a executiva disse estar envergonhada por tantas denúncias que pesam contra a empresa que ela comanda, em especial envolvendo comandantes de empresa há até pouco tempo. 

Foster prestou depoimento por mais de sete horas numa oitiva marcada pela contínua tentativa dos governistas de atrapalhar as investigações. Seguindo estratégia do Palácio do Planalto, a titular da companhia se estendeu por quase uma hora em sua exposição inicial e, em seguida, respondeu por mais de duas horas as 139 perguntas do relator da comissão, deputado Marco Maia (PT-RS).

A refinaria norte-americana foi adquirida pela Petrobras por meio de uma negociação duvidosa, que exigiu, ao todo, o desembolso de US$ 1,249 bilhão e representou prejuízo de US$ 530 milhões.

Orçada inicialmente em US$ 2,5 bilhões, a unidade pernambucana seria erguida a partir de uma parceria entre a companhia brasileira e a PDVSA, estatal Petróleos da Venezuela S.A. No entanto, a empresa do país vizinho abandonou a sociedade. Desde então, cabe à Petrobras concluir a Abreu e Lima por um custo nove vezes superior ao estimado preliminarmente – US$ 18,5 bilhões.

Outro episódio que levanta suspeitas ocorreu no ano passado, quando o banco BTG Pactual pagou US$ 1,5 bilhão para ficar com metade das operações africanas da Petrobras e se tornar sócio da estatal. Esses ativos eram avaliados, no entanto, em US$ 7 bilhões.

O líder do PSDB na Câmara, Antonio Imbassahy (BA), chamou atenção para a longa e estreita amizade entre Foster e a presidente Dilma Rousseff e perguntou quantas vezes as duas trataram dos três temas. “Foram tantos os fatos, denúncias, indícios e comprovações de negociatas que levaram um ex-diretor da Petrobras à prisão”, afirmou o líder.

Ele criticou ainda conduta dos governistas e garantiu que a oposição vai resistir à mobilização dos aliados da presidente Dilma contra a CPI mista. “Não esperava esse tipo de armação. O relator embromando e embromando. Quem está assistindo está indignado. Está claro que o Palácio do Planalto não quer investigação”, denunciou. “Mas a oposição vai continuar a buscar as pessoas que tanto mal causaram à Petrobras”, assegurou (assista abaixo trecho da entrevista coletiva do tucano).

Titular do PSDB da Câmara na comissão, o deputado Carlos Sampaio (SP) disse que percebeu em Foster um “certo constrangimento de defender o indefensável”. O tucano a questionou sobre as circunstâncias da demissão do ex-diretor da área Internacional Nestor Cerveró, apontado como o responsável pelo resumo tecnicamente falho que balizou a decisão do Conselho de Administração da companhia pela compra de Pasadena. Após ser desligado do cargo, Cerveró assumiu a diretoria financeira da BR Distribuidora, subsidiária da Petrobras.

“Isso só pode ser brincadeira de mau gosto. É a presidente Dilma e o Conselho de Administração da Petrobras dizendo para o Brasil o seguinte: olha, você nos deu um prejuízo de US$ 1 bilhão. Nós não admitimos isso. Por essa razão, a partir de agora, você é o diretor financeiro da BR Distribuidora, uma empresa pública”, reprovou.

Sampaio perguntou a Foster se, em algum momento dos seus 32 anos dedicados à petroleira, ouviu falar das peripécias do ex-diretor de Abastecimento Paulo Roberto Costa. “Desde 2009, ouço falar histórias do senhor Paulo Roberto. Nunca fui à Petrobras. A senhora nunca ouviu falar absolutamente nada ali dentro sobre as vinculações escusas, promíscuas e de quinta categoria do Paulo Roberto?” O ex-diretor foi preso de novo pela Polícia Federal  nesta quarta-feira.

CONTRATO SUSPEITO – A respeito da Abreu e Lima, o tucano contestou a segurança jurídica da negociação fechada entre a Petrobras e a PDVSA. “Se tivesse um contrato à altura da Petrobras e do Brasil, a senhora acha mesmo que um país sócio poderia não ter vindo desde o primeiro momento? Se não veio e não teve ônus é porque o contrato foi mal redigido”, destacou.

O parlamentar criticou ainda a negociação dos poços africanos da companhia com o BTG Pactual. “Menos de oito meses após concretizar essa compra, o BTG começou a recuperar o capital investido e distribuiu naquele ano R$ 150 milhões em lucro aos seus acionistas. Foi o melhor negócio da China.”

O deputado Izalci (DF), suplente do PSDB da Câmara no colegiado, disse que Foster estaria sendo usada pelo PT, partido ao qual ela é filiada há quatro anos, e pelo governo. O tucano lembrou a participação de Alberto Feilhaber na negociação que culminou na compra de Pasadena. Ex-funcionário da Petrobras, ele é um dos principais executivos da Astra Oil – comercializadora que vendeu a unidade para a empresa brasileira.

“O governo deveria assumir que Pasadena foi um mau negócio e teve a participação do Cerveró, Paulo Roberto Costa e Alberto”, disse Izalci, que sugeriu a quebra do sigilo telefônico dos três para comprovar a atuação deles na “negociata”.

Izalci citou ainda relatórios da Agência Nacional do Petróleo (ANP) sobre irregularidades identificadas na Petrobras, como prestação de informações inverídicas. “Existe ainda uma multa de R$ 369 milhões por não efetuar pagamento de royalties. Isso demonstra que fatos relevantes não são informados à sociedade”, disse.

DINHEIRO JOGADO FORA – Em quase uma hora de apresentação, Foster reiterou o valor total investido na aquisição de Pasadena (US$ 1,249 bilhão) e admitiu, mais uma vez, que o negócio não foi bom para a companhia. Ela reafirmou ainda que o resumo executivo no qual o Conselho de Administração se baseou para aprovar a negociação da primeira parte da unidade não explicitava as cláusulas “Put Option” e “Marlim”.

A primeira determinava que, havendo desavença entre os sócios de Pasadena, a outra parte seria obrigada a adquirir o restante das ações. A “Marlim” assegurava à empresa belga Astra Oil, sócia da Petrobras no negócio, lucro de 6,9% ao ano. A presidente também atribuiu à diretoria colegiada da Petrobras a responsabilidade por motivar o conselho de administração a comprar a unidade norte-americana.

TODOS OS ERROS – Sobre a construção da refinaria Abreu e Lima, Foster reconheceu o atraso de três anos na conclusão da obra e que a primeira estimativa de custo da unidade, US$ 2,5 bilhões, compreendia somente a refinaria, excluindo a infraestrutura em volta, como as rodovias. “Esse projeto não saiu da prancheta. Nossas referências foram expansões e custos unitários de valor evidentemente baixo”, argumentou. Ela disse que a petroleira pode ter cometido “todos os erros” no planejamento de Abreu e Lima, mas garantiu que os projetos do empreendimento foram elaborados de “forma técnica” e contaram com aprovação da diretoria da estatal. A unidade pernambucana está 87% concluída e custará ao todo US$ 18,5 bilhões.

A dirigente se recusou a repetir a expressão “conta de padeiro” adotada pelo ex-diretor de Abastecimento Paulo Roberto Costa para classificar o primeiro orçamento da refinaria Abreu e Lima. “Eu me nego a repetir essa palavra. Acho medonha em respeito à Petrobras. Não concordo definitivamente que possam atribuir à engenharia da Petrobras essa condição”, disse a dirigente com a voz embargada. “Não aceitamos que digam que tenhamos feito contas de qualquer maneira. Aceitamos que podemos ter errado, mas estamos trabalhando duro para ajustar isso”, acrescentou.

A CPI mista recebeu, até a tarde de quarta-feira (11), 630 requerimentos: 238 já apreciados, 237 aprovados, um indeferido, 375 a serem apreciados e 17 apresentam pendências, como dados incompletos de CPF (Cadastro de Pessoa Física ) e CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica).

(Reportagem: Luciana Bezerra/ Foto: Alexssandro Loyola/ Áudio e vídeo: Hélio Ricardo)