Esmola, não, por Rodrigo de Castro


Os prefeitos mineiros vão se reunir na Assembleia Legislativa em 13 de dezembro, em ato que se prevê de grande mobilização, para chamar a atenção sobre as dificuldades que vêm enfrentando na administração das prefeituras. Pode-se depreender que o evento tem dois objetivos principais: a conscientização das pessoas para o fato de que existe um claro e insustentável desequilíbrio entre encargos e recursos financeiros atribuídos ao município e a cobrança pública de uma solução por parte do governo federal. A data foi batizada como Dia do Basta, o que já revela o grau de indignação dos prefeitos e o tom de protesto das reivindicações.

O que se observa no propósito desse movimento é que os prefeitos começam a deixar de lado a postura suplicante que sempre tiveram em relação ao poder central, assumindo uma atitude menos subordinada na manifestação de seu inconformismo, podendo estar aí o início de um processo de revolta federativa. Essa mudança de espírito reivindicativo não surpreende. É apenas resposta natural à indiferença com que o governo da presidente Dilma costumeiramente tem tratado a causa dos municípios.

Anualmente, desde 1998, vem sendo realizada a Marcha a Brasília em defesa dos municípios, uma mobilização que apresenta às autoridades federais o quadro dos problemas e dificuldades vividas pelos municípios. O ponto recorrente da pauta desses eventos sempre foi a necessidade de uma distribuição mais equânime dos recursos tributários arrecadados pela União, o que é conhecido como revisão do pacto federativo. Pois bem, nesses 15 anos de marcha, nunca houve uma medida concreta no sentido de atendimento dessa reivindicação, nem mesmo se percebe boa vontade para discutir o assunto.

Por outro lado, os diversos encontros com prefeitos programados pelo próprio governo federal são quase sempre ou para anunciar lançamento de novos programas ou descentralização administrativa de programas já existentes – o que representa novos encargos municipais –, ou para propor medidas paliativas de reposição de perda, sempre emolduradas como concessões, fruto da magnanimidade presidencial. Isso permite concluir, sem medo de errar, que faz parte da estratégia do governo central, para criar uma áurea de ação benfazeja, manter os prefeitos em permanente situação de mendicância.

A realidade nua e crua é que os municípios e estados encontram-se em situação de falência. Não têm mais como garantir a prestação de serviços públicos que a eles foi atribuída ao longo do tempo. Enquanto a participação de estados e municípios na arrecadação tributária do país é aproximadamente de apenas 30%, são eles responsáveis por cerca de 70% da prestação de serviços públicos, pretendendo-se, por recente medida, imputar aos entes locais até mesmo o custo da iluminação pública.

O “basta” que sai de Minas é grito em defesa do estado brasileiro, cuja essência de constituição está no sistema federativo, assentado nos pilares da autonomia e da solidariedade. Autonomia decorre da exata proporção entre atribuições e participação no bolo arrecadatório. Solidariedade tem a ver com união, ajuda e comprometimento dos entes federados, como um todo, no cumprimento da finalidade do Estado que é a realização do bem comum. O grito de Minas é contra a descentralização das obrigações e a concentração dos recursos nas mãos do governo federal, situação agravada com as sucessivas e arbitrárias desonerações via redução da base de cálculo do FPE e FPM. O grito de Minas é pelo respeito aos gestores municipais, aos quais, tendo sido imposta a obrigação de executar os programas oficiais, não foram dados os recursos necessários nem mesmo a possibilidade de adequá-los às características e reais necessidades de seu município, o que injusta e covardemente os expõe à malhação por seus munícipes.

É de se orgulhar, nesse processo de fortalecimento do Estado brasileiro por meio do resgate do conceito e verdadeiro sentido do federalismo, ver Minas, mais uma vez, saindo na frente e mostrando que não trabalha só em silêncio. Grita, quando é preciso. E essa é uma histórica liderança, de que vale lembrar pelo menos dois fatos: um, bastante conhecido, o grito contra o quinto e a derrama da Coroa portuguesa, no século 18; o outro, pouco divulgado, mas de profunda consequência, a Declaração de Poços de Caldas, o primeiro documento público do Movimento das Diretas Já, assinado por Tancredo Neves e Franco Montoro. No último 18 de novembro, ao completar 30 anos, dentro do mesmo princípio da reivindicação democrática e sob a bandeira dos novos tempos, esse documento foi reeditado como “Federação Já”, o novo clamor da sociedade brasileira: o de fortalecimento dos municípios para a garantia e melhoria dos serviços públicos. Dia do Basta e “Federação Já” são manifestações da coragem, do espírito democrático e reivindicativo, e da capacidade de articulação dos mineiros em reação contra a precarização dos municípios e a esmola federal.

(*) Rodrigo de Castro é deputado federal pelo PSDB de Minas Gerais. Artigo publicado no jornal “Estado de Minas” em 3/12. (Foto: Gustavo Lima – Câmara dos Deputados)

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3 dezembro, 2013 Artigosblog Sem commentários »

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