Uma luz para a Aneel, por Rodrigo de Castro


rodrigoEsgota-se em 31 de janeiro de 2014 o prazo dado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) às distribuidoras de energia elétrica para transferirem aos municípios a responsabilidade pela iluminação pública, passando a ser encargo dos entes municipais a gestão do sistema, que abrange elaboração dos projetos de expansão, operação e manutenção. Será, portanto, o município – e não a Cia. Energética de Minas Gerais (Cemig, em nosso estado) –, o órgão a acionar nos casos de reposição de lâmpadas, suportes, chaves, luminárias, reatores, relés, cabos condutores e outros materiais correlatos.

Apesar de a ameaça estar posta desde 2010, com a Resolução 414, a mudança assusta prefeitos e usuários tanto pelo risco de prejuízo na qualidade do serviço quanto pela elevação dos custos operacionais e inevitável repasse à população, que deverá suportar, segundo estimativas de entidades do setor, aumento de tarifa da ordem de 30%. Para assumir o novo papel, os municípios terão que se aparelhar, criando estrutura própria, ou contratando terceiros, hipótese que dificulta a contenção tarifária.

Em várias oportunidades, marchas a Brasília e encontros no Congresso, os municípios apresentaram ao governo federal fundamentados pedidos de reversão da medida. Eu mesmo, representando os municípios mineiros, solicitei à Aneel a reforma da resolução, e a única flexibilidade conseguida foi a prorrogação do prazo de aplicação da medida. Muitos municípios, diante da intransigência da agência, buscaram a Justiça e obtiveram medida liminar protetiva, que os desobriga da aceitação da transferência do sistema de iluminação pública.

Notam-se vários erros na decisão do governo federal de impor aos municípios essa nova e onerosa atribuição. Primeiro, uma exorbitância de poder que afronta a lei, uma vez que não se insere na competência da agência reguladora criar encargos para os entes federativos. A entidade deve se ater, única e exclusivamente, à regulação e fiscalização das atividades de sua área de atuação. Sob esse aspecto, a resolução da Aneel lembra as recentes trapalhadas do governo em resposta às manifestações populares por ocasião da Copa das Confederações, agindo à revelia do ordenamento jurídico e provocando insegurança e custos.

Segundo, uma estreiteza de gestão por não considerar as dificuldades ora vivenciadas pelos municípios, onde repercutem as mazelas decorrentes da inércia, leniência e omissão. A população está carente de serviços de saúde. Não tem leitos, nem equipamentos, nem remédios. Está carente de educação de qualidade. Não há treinamento para professores, nem remuneração adequada. O governo federal recusa-se a rever seu percentual de participação nos custos, conforme proposto na Emenda 29, e foge da ideia de federalização da educação como de um monstro aterrorizador. Enquanto a União é detentora de 70% de toda a arrecadação tributária, cerca de 70% dos recursos públicos aplicados nos municípios vêm do estado e do próprio município. Nesse contexto, a imposição do encargo da iluminação pública desviará recursos dessas áreas já tão sacrificadas.

Terceiro, um desvirtuamento do espírito federativo. O Brasil constitui-se numa República Federativa que deve fundar-se na solidariedade entre os entes formadores, com vista à realização do bem comum. Para evitar a redução das atividades econômicas, o governo federal lança mão de tributos de destinação municipal para subsidiar o setor automotivo e outros, nessa funesta tendência de prestigiar campeões. Ao contrário, diante das reivindicações de revisão do pacto federativo, mostra-se indiferente. E, quando o assunto é renegociação de dívidas de estados e municípios, mantém-se inflexível nas extorsivas condições de contratos antigos, em que o serviço da dívida impede a expansão do crescimento. Os novos custos impostos pela Aneel, sem levar em conta a real situação de quase falência dos municípios, representam mais uma afronta ao ideal federalista.

Quarto, uma notória falta de sensibilidade para o fato de que a iluminação é vital para a segurança pública, um serviço de caráter coletivo, cuja prestação tem que ser garantida a todos, ainda que moradores de municípios sem condição financeira para sustentá-los, sendo assim uma atribuição do poder público, que tem a União como coobrigada ou responsável última.

Considerando que alguns municípios têm condições financeiras e operacionais para absorver os novos custos, afigura-se como medida de bom senso que a Aneel reveja a sua resolução para deixar àqueles entes a opção de receber ou não o ativo imobilizado representativo do sistema de iluminação pública e de assumir a sua operação e manutenção. Isso evitará um caudal de ações na Justiça, atravancando ainda mais o sistema judiciário e afastando, inutilmente, a Aneel de suas legítimas funções. Luz para a Aneel e para todos.

(*) Rodrigo de Castro é deputado federal pelo PSDB-MG. Artigo publicado no jornal “Estado de Minas” em 22/10. (Foto: Alexssandro Loyola)

 

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23 outubro, 2013 Artigosblog Sem commentários »

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