Vale-tudo na TV, por Marcus Pestana


Bastaria o bom senso para se entender que um presidente da República não pode convocar a formação de uma cadeia nacional de televisão para atacar e desqualificar seus críticos e adversários, tendo em vista a própria reeleição ao cargo em 2014.

Na ausência do bom senso, entretanto, vale assinalar que o Brasil tem normas claras sobre isso – há nada menos que cinco décadas. Toda a convocação de rede de TV por autoridades é regida por um decreto de 1963, que leva a assinatura do então presidente João Goulart, deposto no ano seguinte pelos militares.

Dentre outras autoridades, o presidente da República está autorizado a fazê-lo “na preservação da ordem pública e da segurança nacional ou no interesse da administração”, conforme estabelecido no decreto 52.795, de 31 de outubro de 1963. Como reina a calma no país e não há qualquer ameaça à segurança nacional, o interesse da administração pública vem sendo a motivação – muitas vezes de fato correta e justificada, como por exemplo no caso de reforço a campanhas nacionais de saúde.

Há momentos em que é necessário trazer o óbvio à tona. Mesmo usando das prerrogativas legais do cargo em que foi investido pelo sufrágio universal, um presidente da República está impedido de se valer de um instrumento de Estado – no caso uma cadeia oficial de radiodifusão – em benefício de si próprio e de seu partido político. Infelizmente, entretanto, os métodos condenáveis da República Velha voltam a assombrar o horizonte, embora tenhamos aprendido nos bancos escolares que seu período se encerrou em 1930. Teremos em breve uma versão pós-moderna do coronelismo?

Salta aos olhos a desfaçatez com que se tomou de assalto o horário nobre da televisão, durante oito minutos, sob o pretexto de fazer um comunicado a respeito da redução do valor das contas de luz. Pouco depois, na internet, sem qualquer disfarce os próprios aliados registravam com satisfação que Dilma Rousseff havia, enfim, feito lançamento de seu próprio nome para mais um mandato no Palácio do Planalto.

O pronunciamento da semana passada carrega a marca do marketing político típico das campanhas eleitorais. Os críticos e os adversários “erraram feio”, a oposição pessimista foi vencida, e há dois tipos de brasileiros:  os que trabalham “para unir e construir” e os que o fazem para “desunir ou destruir”. E o país viverá ainda melhor quando só existirem os primeiros. Vejam e revejam o programa, leiam e releiam, pois está tudo lá. Não se trata de um ato falho. É a sua mensagem principal.

Os altos índices de aprovação de um governo não lhe permitem o vale-tudo diante das instituições democráticas. É preciso dar um basta na apropriação da estrutura da administração pública e do Estado para fins político-partidários, como o faz o PT com apetite e voracidade sempre ampliada. O exemplo a evitar, o da Venezuela, está logo ali, com as arengas intermináveis de Hugo Chávez nas frequentes redes de radiodifusão por ele convocadas. Diante dessa comparação inevitável, resta o consolo: podia ser pior.

(*) O deputado federal Marcus Pestana é presidente do PSDB-MG. (Foto: Alexssandro Loyola)

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31 janeiro, 2013 Artigosblog Sem commentários »

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