No fundo do poço
Com rumos incertos e sob forte influência política, Petrobras corre risco de afundar
Apesar de não estar conseguindo dar conta de seus investimentos em petróleo, a Petrobras acaba de ganhar nova incumbência do governo federal: assegurar a expansão da produção de etanol do país. “As incertezas decorrentes da forte ingerência da União na empresa já têm custado caro à Petrobras e seus acionistas, que já perderam R$ 60 bilhões neste ano. Com rumos incertos, a terceira maior companhia de energia do mundo corre risco de afundar”, alerta o Instituto Teotonio Vilela em sua Carta de Formulação e Mobilização Política desta quarta-feira (22). Leia a íntegra abaixo:.
A Petrobras está num mato sem cachorro. Apesar de não estar conseguindo dar conta de seus investimentos em petróleo, a terceira maior companhia de energia do mundo acaba de ganhar uma nova incumbência do governo federal: assegurar a expansão da produção de etanol do país. Com rumos tão incertos, a empresa corre risco de ir ao fundo do poço.
O governo decidiu exigir que a Petrobras eleve sua participação no mercado nacional de etanol dos atuais 5% para 12%. O objetivo, segundo O Globo, é “evitar a falta de álcool combustível e a consequente disparada de preços no período da entressafra da cana a partir de 2012”.
A estatal será forçada a construir novas usinas, contando com financiamentos generosos do BNDES, que cobrirão também a formação de canaviais e a ampliação da estocagem. Da operação, resultará uma forte intervenção do Estado em mais um mercado até aqui predominantemente privado.
De sua parte, a Petrobras irá se desviar ainda mais do seu principal e mais caro objetivo: desenvolver a exploração de petróleo das reservas do pré-sal e expandir a capacidade de refino no país, estagnada ao longo de anos. “Não é algo barato. Mas como é de interesse do povo, não se deve medir esforços”, justificou o ministro Edison Lobão. Quem pagará a conta?
A decisão de forçar a Petrobras a entrar com ímpeto no mercado de etanol vem no mesmo momento em que o governo federal, acionista majoritário da empresa, exige cortes no plano de negócios da companhia até 2014.
O valor já decresceu de US$ 260 bilhões para os atuais US$ 224 bilhões, mas ainda não se chegou a um denominador comum. Na sexta-feira passada, o conselho de administração da empresa exigiu novos ajustes. A orientação é ser “mais realista”. Como tocar os 681 projetos que a Petrobras tem em carteira, ninguém diz.
As incertezas decorrentes da forte ingerência do governo na empresa já têm custado caro à Petrobras e a seus acionistas. A companhia está hoje na contramão de suas congêneres globais. Desde o início de novembro de 2010, quando o preço do petróleo voltou a subir, as ações das principais empresas de energia da América do Norte registram alta de 21,4%. Já os papéis da Petrobras negociados nos EUA tiveram queda de 1,4%, mostrou a Folha de S.Paulo no sábado.
Em moeda sonante, desde fins de 2010 a Petrobras perdeu R$ 60 bilhões de valor de mercado. O valor equivale à metade do que foi arrecadado no processo de capitalização concluído em setembro passado. A operação resultou num forte aumento da participação da União no capital da companhia: de 39,8% para 48,3%. Desde então, a petroleira só afundou.
Um de seus principais problemas é não poder reajustar os preços dos combustíveis que comercializa. A gasolina vendida hoje no Brasil tem valor 18% inferior ao praticado nos EUA. Na semana passada, a empresa pediu um reajuste de 10% ao governo, que seria contrabalançado por uma redução na Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico). A Fazenda não topou.
A manipulação dos preços dos combustíveis, decorrente do monopólio no refino e da predominância da BR Distribuidora no varejo, distorce o mercado e é, inclusive, apontada como uma das principais razões para a falta de investimento na expansão do etanol.
“O setor tem dificuldade de investir em plantas dedicadas a etanol pela grande incerteza quanto à evolução do preço da gasolina, administrado pela Petrobras e mantido no mesmo patamar desde 2005. (…) O investidor teme a falta de regras claras que permitam a convivência e a competição entre dois mercados com estruturas distintas – o de etanol, pulverizado e competitivo, e o da gasolina, um quase monopólio”, escreveu Marcos Sawaya Jank, presidente da Unica.
O setor de etanol necessita, de fato, se expandir. Precisará de R$ 80 bilhões em investimentos nos próximos dez anos para atender à demanda. Isso significa 133 usinas, ou 15 unidades por ano, o triplo da média prevista para 2011. A área plantada com canaviais também teria de ser duplicada, para 18 milhões de hectares.
Nada indica, porém, que o ingresso de uma empresa com a força da Petrobras seja capaz de impulsionar os investimentos privados no setor de etanol. O mais provável é que as distorções que já se fazem sentir no setor de combustíveis fósseis migrem para o dos renováveis.
O pior é o que pode ocorrer com a Petrobras, onde centenas de milhares de trabalhadores investiram seu FGTS. A empresa tornou-se um joguete nas mãos do interesse político do governo federal; hoje, o que menos interessa na companhia é gerar resultados. A continuar assim, será difícil a Petrobras cumprir as missões que o acionista majoritário espera dela. O futuro mostra-se escuro como petróleo e não cristalino como álcool.
(Fonte: ITV)
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