Transparência na política, por Paulo Abi-Ackel
A sociedade tem motivos para ver com ressalvas a atividade política no país. Parte desses motivos resultam, muitas vezes, de críticas infundadas de parlamentares que, de boa-fé, não hesitam em expor pontos de vista que comprometem ações legítimas e trazem desconfianças sobre ações administrativas com respaldo na Constituição Federal. Exemplo desse tipo foi protagonizado pelo deputado federal Reginaldo Lopes (PT-MG), quando apresentou proposta de emenda constitucional (PEC) destinada a pôr fim às Leis Delegadas. Se essa iniciativa tivesse o mérito de valorizar o Poder Legislativo seria não só bem-vinda como mereceria o aplauso da oposição. Seu objetivo tem endereço, pois se destina a desgastar os governos do PSDB em Minas Gerais, um dos quais solicitou e obteve da Assembleia Legislativa do Estado a delegação para editar leis de conteúdo puramente administrativo. Nem poderia ser de outra natureza a delegação legislativa, porque esta se atém necessariamente aos limites traçados em seu texto.
As leis delegadas são um instrumento previsto na Constituição Federal e em duas dezenas de Constituições Estaduais. Seu objetivo é o de autorizar o chefe do Poder Executivo a editar normas sobre fins claramente especificados, durante tempo também demarcado. Sua finalidade, na maior parte dos casos, é o de reogarnizar serviços administrativos, o que importa na busca da eficiência e modernização dos órgãos oficiais. As políticas públicas e as matérias de competência exclusiva do Legislativo não podem ser objeto de delegação. Vejamos como se comporta o PT diante do mesmo problema. Enquanto em Minas Gerais o governo estadual se subordinou à autoridade da Assembleia ao lhe pedir a autorização para reogarnizar setores de sua administração, em Brasília, o governador petista não teve esse cuidado: ao contrário, impôs o conjunto de reformas administrativas de seu interesse, por decreto. Não se submeteu ao Legislativo local, nem antes nem depois de concluída a reforma administrativa do governo. Pode-se ver por este exemplo que há, no caso, dois pesos e duas medidas, pois o que é do interesse do governo petista deve ser feito logo, sem respeito à ordenação constitucional, enquanto que ao governo, do PSDB, a mesma ação não deve ser praticada, mesmo com a autorização prévia do Legislativo.
O governo do PMDB, no Rio de Janeiro, já usara anteriormente do mesmo recurso constitucional, sem que as medidas reestruturadoras de seus serviços, autorizados por uma Lei Delegada, tivesse despertado incômodo em qualquer dos setores políticos do estado. É impossível abordar esse assunto sem lembrar o contrassenso que envolve a PEC do deputado Reginaldo Lopes. Ele pertence ao partido que, desde o momento em que ocupou o governo, se entregou à produção industrial de medidas provisórias, que representam a mais categórica invasão das atribuições do Legislativo.
(*) O deputado Paulo Abi-Ackel (MG) é líder da Minoria na Câmara dos Deputados. Artigo publicado no jornal “O Estado de Minas” em 23/3/11.
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