Caos aéreo
Anac não enfrenta problemas de infraestrutura nos aeroportos, avalia ITV
Em análise de conjuntura divulgada nesta segunda-feira (6), o Instituto Teotônio Vilela (ITV) avalia que a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) não enfrenta o problema central do setor aéreo: a deterioração da infraestrutura aeroportuária do país. “É unânime a avaliação quanto ao estado de penúria atual e isso não é de hoje. Junte-se a isso o inexistente planejamento de nossas autoridades aéreas. Da soma, resulta o improviso que grassa no setor, para o qual muito colabora a incúria da tão mastodôntica quanto ineficiente Infraero”, destaca o trecho do documento.
Ainda de acordo com o levantamento, o aumento da fiscalização pela Anac, anunciada na última reunião de emergência da agência com as empresas aéreas para tentar evitar o caos no final do ano, “mais parece piada”. “Quem teve algum problema num aeroporto recentemente sabe disso: teve de se queixar ao bispo, porque a Anac simplesmente desativou praticamente todos os balcões de atendimento que tinha nos teminais”, avalia o artigo, cuja íntegra está disponível abaixo:
Voo cego
Até pouco tempo atrás, a aproximação das festas de fim de ano era motivo apenas de comemoração e júbilo. Mas para os que usam aeroportos no país a data tornou-se também uma tremenda dor de cabeça. Voar pelo Brasil para comemorar o Natal e o Ano Novo ou para descansar numa praia ensolarada tornou-se uma aventura – sem nenhuma graça. Ninguém garante que não será novamente assim nas próximas semanas.
A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) diz que não há razão para temores. Será? Há duas semanas, o órgão enfileirou todos os seus dirigentes e os diretores de todas as companhias aéreas em torno de uma mesa para indicar que estava “pondo ordem” na casa. Não há dúvida de que tenha sido uma medida extemporânea, por tardia demais. Há quem diga que não passou de pirotecnia. Na melhor das hipóteses, serão paliativos.
Uma dos principais deliberações da Anac foi proibir o overbooking, prática pela qual as companhias de aviação vendem um número de bilhetes acima dos assentos disponíveis. Outra foi informar que a agência colocará todo o seu exército de funcionários vigiando a normalidade dos aeroportos. Nenhuma delas deve surtir qualquer efeito: uma semana depois, já tinha empresa apresentando problemas sérios; foi a terceira a falhar em quatro meses.
O overbooking não é exclusividade brasileira; é inerente ao setor aéreo. Como o índice de desistências é alto, sempre se vende mais do que o avião acomoda, para evitar perdas. Quase nunca fica gente de fora. Para fazer diferente, as passagens terão de ficar mais caras para todos. Assim, é possível que quem só agora está tendo o gostinho de voar de avião tenha que cair fora, numa cortesia do governo do PT.
Quanto ao aumento da fiscalização pela agência, mais parece piada. Quem teve algum problema num aeroporto recentemente sabe disso: teve de se queixar ao bispo, porque a Anac simplesmente desativou praticamente todos os balcões de atendimento que tinha nos terminais. Aos passageiros prejudicados, a agência oferece, gentilmente, a opção de reclamar por meio da internet ou de um 0800 da vida. Fará tudo diferente do que fez até hoje?
O problema central, a Anac não enfrenta: a deterioração da infraestrutura aeroportuária do país. É unânime a avaliação quanto ao estado de penúria atual e isso não é de hoje. Junte-se a isso o inexistente planejamento de nossas autoridades aéreas. Da soma, resulta o improviso que grassa no setor, para o qual muito colabora a incúria da tão mastodôntica quanto ineficiente Infraero.
Os “apagões aéreos” se instalaram na rotina dos brasileiros pelo menos desde fins de 2006. Neste meio-tempo, o fluxo de passageiros cresceu 50%, para 153 milhões neste ano. Mas parece não ter sido suficiente para que alguma ação estratégica fosse posta em marcha pelo governo Lula. O pouco que houve foram remendos, que estão fazendo água por todo lado.
Há mais gente com condições financeiras de tomar um avião no país, mas a estrutura aeroportuária é a de sempre. Resultado: a Anac já dá de barato que 18% das decolagens vão atrasar e 5% serão canceladas neste fim de ano. É o mesmo percentual de um ano atrás. Como um órgão regulador pode se dar por satisfeito com uma situação que se manterá tão ruim quanto há um ano?
O governo federal anuncia investimento de R$ 5,6 bilhões na melhoria de 13 dos nossos aeroportos com vistas à Copa do Mundo de 2014. Até agora, porém, quase nada foi feito: neste ano, até outubro, a execução estava em 22% do orçado e só dois terminais tinham obras. Nos de Goiânia e Vitória, por exemplo, elas não saem do papel por causa de irregularidades.
Não surpreende, portanto, que a Iata, que congrega as companhias aéreas de todo o mundo, considere que 13 dos 20 maiores terminais brasileiros não conseguem dar conta da demanda. É um “desastre crescente” que deixa antever um “vexame” daqui a quatro anos, diz.
Para o ministro da Defesa, isso não passa de “terrorismo” das empresas. Mas ele não tem a concordância nem de seus colegas de ministério. Entre os aeroportos mais abarrotados do planeta, estão vários brasileiros, como Santos Dumont (com a segunda maior alta no fluxo de passageiros no mundo em 2009, de 40,6%), Brasília, Confins e Salvador.
O próprio BNDES estima que nos próximos 20 anos a capacidade aeroportuária brasileira terá de ser multiplicada por 2,4 vezes: de 130 milhões para 310 milhões de passageiros por ano. Se tudo continuar como está, a bomba vai estourar bem antes.
Neste quadro de penúria, é positivo que a presidente eleita comece a falar em abrir o capital da Infraero e conceder os aeroportos brasileiros à exploração privada, numa experiência que começaria por sete terminais. Também é salutar tirar a administração da aviação civil da alçada da Defesa – o Brasil é um dos poucos países no mundo em que o Ministério dos Transportes não cuida de um dos modais de transporte. Resta ainda saber o que ela fará com a Anac, único órgão regular inteiramente implantado na gestão Lula e cuja atuação serve como exemplo de tudo o que não se deve fazer em prol do país.
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