Persona non grata, por Alvaro Dias
Shahriar Mandanipour – escritor iraniano no exílio (recorrendo a metáfora futebolística para definir a visita de Ahmadinejad)
A decisão do governo brasileiro de recepcionar o chefe de um regime ditatorial e repressivo constituiu um enorme equívoco da política externa do presidente Lula. Ao acolher figura tão controversa, o anfitrião atentou contra a nossa própria Carta Magna, que, entre outros valores, consagra a democracia e os direitos humanos como pilares cardeais.
Faço questão de reproduzir o que afirmei da tribuna do Senado Federal no dia da chegada do visitante – persona non grata – para utilizar apenas uma expressão do jargão diplomático: pessoa não bem vinda.
Não há pragmatismo que justifique receber um chefe de Estado que nega o Holocausto e prega a destruição de Israel. Como se não bastassem posições antissemitas e outras aberrações defendidas pelo mandatário iraniano, o seu governo desenvolve um nebuloso programa nuclear direcionado para fins militares e reprime de forma sanguinária os opositores. Não podemos esquecer o “tratamento” recebido pelos manifestantes que foram às ruas contestar o caráter duvidoso da sua reeleição. A esse respeito, registro o tom obsequioso das declarações oficiais durante a permanência do presidente iraniano em Brasília. Nenhuma condenação sobre a recusa de Teerã de submeter-se a monitoramento internacional de seu projeto nuclear, nem mesmo uma reprimenda sobre as violações de direitos humanos no país e as suspeitas de fraudes nas urnas.
As relações diplomáticas mantidas com o governo do Irã já são suficientes e respeitam a moldura institucional de um relacionamento bilateral. Por que estreitar esses laços e legitimar politicamente um regime isolado no plano internacional? E afinal de contas: Por que receber com pompa e circunstância Ahmadinejad?
O intercâmbio comercial entre os dois países, em que pese ser favorável ao Brasil, é pouco expressivo no cômputo geral do comércio exterior brasileiro. As vendas do Brasil para o Irã (carne, óleo de soja, açúcar, milho, minério de ferro, papel, peças automotivas, etc) alcançaram o patamar de US$ 1,1 bilhão em 2008, o que representa aproximadamente 0,5% de todas as exportações brasileiras naquele ano. As importações (enxofre, frutas, pistache, tapetes, peles) são da ordem de US$ 14,7 milhões, menos de 0,01% do total das importações do Brasil em 2008.
É possível ampliar a pauta de exportações para o Irã e expandir consideravelmente o atual intercâmbio comercial sem que seja necessário receber em solo pátrio o líder de um governo que representa um pequeno grupo da guarda islâmica.
A partir de agora cerramos fileiras ao lado da Venezuela, Bolívia, Equador e Nicarágua -, países que decidiram abrigar o Irã como membro observador na quixotesca Alba (Alternativa Bolivariana para as Américas) – avalizando um governo e um dirigente que vem se alçando à condição de um “pária internacional”.
O semblante pacífico e sorridente exibido pelo presidente iraniano nas solenidades e recepções palacianas em sintonia com as declarações presidenciais de “estar feliz” em recebê-lo, nos remetem aos versos íntimos do poeta Augusto dos Anjos: “…a mão que afaga é a mesma que apedreja”.
(*) O senador Alvaro Dias é o 1º vice-líder do PSDB na Casa
(Foto: Ag. Senado)
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